terça-feira, 10 de junho de 2025

“O APÓSTOLO LADRÃO – Parte 2


“O APÓSTOLO LADRÃO – Parte 2

“Então, Maria, tomando uma libra de bálsamo de nardo puro, mui precioso, ungiu os pés de Jesus e os enxugou com os seus cabelos; e encheu-se toda a casa com o perfume do bálsamo. Mas Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, o que estava para traí-lo, disse: Por que não se vendeu este perfume por trezentos denários e não se deu aos pobres? Isto disse ele, não porque tivesse cuidado dos pobres; mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, tirava o que nela se lançava” (Jo 12.3-6).

“E encheu-se toda a casa com o perfume do bálsamo”. Em seguida vem a queixa de Judas, a qual Mateus [26.8] atribui indiscriminadamente aos discípulos, e Marcos [14.4], a algum dentre eles. Mas é costumeiro nas Escrituras aplicar-se a muitos, valendo-se de uma metonímia, o que pertence a um ou a uns poucos. Quanto a mim, porém, penso ser provável que a censura tenha procedido somente de Judas, e que os demais se deixaram induzir, dando-lhe seu assentimento, porquanto os murmuradores, bafejando uma chama, facilmente acendem em nós uma variedade de disposições. E, mais especificamente, visto que somos extremamente propensos a formar juízos desfavoráveis, as calúnias prontamente nos influenciam. Mas a credulidade que o Espírito de Deus reprova nos apóstolos constitui uma advertência para não nos deixarmos, tão facilmente e com tanta credulidade, dar ouvidos às declarações caluniosas.

Os demais apóstolos, não movidos de má disposição, porém irrefletidamente, condenaram Maria. Judas, porém, recorre a um plausível expediente em prol de sua impiedade, ao pôr os pobres em evidência, a despeito de não nutrir qualquer preocupação por eles. Por esse exemplo somos instruídos sobre o desejo de possuir algo que nutre uma predisposição tão horrível: a perda daquilo que Judas vê esboçar-se sem uma oportunidade de roubá-lo o incita a uma fúria tal, que não hesita em trair Cristo. E, provavelmente, no que ele disse sobre os pobres sendo defraudados, não só fala falsamente a outros, mas igualmente se vangloriava intimamente, como os hipócritas costumam fazer; como se o ato de trair a Cristo fosse um erro trivial, pelo qual se esforçava em obter compensação pela perda que sofrera. Aliás, ele tinha apenas uma razão para trair a Cristo: recuperar de alguma forma aquilo que deixara escapar de suas mãos, pois foi a indignação inflamada nele, ante o lucro que perdera, que o levou a fomentar o desígnio de trair a Cristo.

É surpreendente que Cristo houvera escolhido, como tesoureiro, uma pessoa desse gênero, a qual ele bem sabia ser um ladrão. Pois que outro desígnio havia senão o de pôr em suas mãos uma corda para se estrangular? Um mero mortal não pode dar nenhuma outra resposta além desta: que os juízos divinos são um abismo profundo. No entanto, a ação de Cristo não deve ser vista como uma regra ordinária para confiarmos o cuidado dos pobres, ou qualquer coisa sacra, a uma pessoa perversa e ímpia. Porquanto Deus estabeleceu uma lei aos que forem chamados a governar a Igreja e a outros ofícios e a essa lei não temos a liberdade de violar. Com Cristo o caso era bem outro: sendo ele a Sabedoria de Deus, propiciou uma oportunidade, em sua predestinação secreta, na pessoa de Judas.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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