“O BATISMO E O LAVAR REGENERADOR DO ESPÍRITO SANTO”
“Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com todos, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tt 3.4,5).
Não tenho dúvida de que aqui há pelo menos uma alusão ao batismo, e não faço objeção se toda a passagem deve ser explicada em termos de batismo. Não que a salvação seja obtida no símbolo externo da água, mas porque o batismo nos sela a salvação conquistada por Cristo. Paulo está tratando da manifestação da graça de Deus que, já dissemos, consiste da fé. Visto, pois, que o batismo é parte dessa revelação, até onde ela se destina a confirmar a fé, Paulo está certo em mencioná-lo aqui. Além disso, visto que o batismo é nosso ingresso na Igreja e o símbolo de nosso enxerto em Cristo, é oportuno que Paulo o introduza aqui, ao pretender demonstrar que a graça divina se nos manifestou. Eis o fio do pensamento desta passagem. “Deus nos salva mediante sua misericórdia, e Ele nos deu, no batismo, um símbolo e penhor dessa salvação, admitindo-nos em sua Igreja e enxertando-nos no Corpo de seu Filho”.
Os apóstolos geralmente baseiam um argumento nos sacramentos quando pretendem provar o que está implícito neles, já que deve ser aceito como princípio estabelecido entre os piedosos que Deus não trata conosco usando figuras destituídas de conteúdo, senão que interiormente efetua, por seu próprio poder, aquilo que Ele pretende nos mostrar por meio de um sinal externo. Por isso se expressa adequada e genuinamente que o batismo é o “lavar regenerador”. O poder e o uso dos sacramentos são corretamente subentendidos quando conectamos o sinal com aquilo que está implícito nele, de tal forma que o sinal não é algo vazio e ineficaz, e quando, querendo enaltecer o sinal, não despojamos o Espírito Santo do que lhe pertence.
Ainda que Paulo mencione o sinal com o intuito de exibir-nos claramente a graça de Deus, todavia nos tolhe de fixarmos nele toda a nossa atenção; por isso imediatamente põe diante de nós o Espírito, para que saibamos que não somos lavados pela água, e, sim, pelo Seu poder, como o expressa o profeta Ezequiel: “Então aspergirei água pura sobre vós. E ficareis purificados... Ainda porei dentro de vós o meu Espirito” (Ez 36.25,27). As palavras de Paulo, aqui, concordam tão plenamente com aquelas do profeta que na verdade estão falando a mesma coisa. É o Espírito de Deus quem nos regenera e nos transforma em novas criaturas; visto, porém, que sua graça é invisível e oculta, no batismo nos é dado um símbolo visível dela.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
*Pastorais - Edições Paracletos.
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