“Quem nos dará a conhecer o bem?”
“Há muitos que dizem: Quem nos dará a conhecer o
bem? SENHOR, levanta sobre
nós a luz do teu rosto. Mais alegria me puseste no coração do que a alegria
deles, quando lhes há fartura de cereal e de vinho” (Sl 4.6,7).
Vemos aqui que Davi compara um só desejo que fazia arder seu próprio coração com os inumeráveis
desejos com os quais quase todo o gênero humano se entretém. Como não é um
princípio defendido pelos ímpios e que exerce influência sobre eles, a saber,
que os únicos que podem ser verdadeira e perfeitamente felizes são os que se
interessam pelo favor divino, os quais devem viver como estrangeiros e
peregrinos no mundo, a fim de que pela esperança e pela paciência obtenham, no
devido tempo, uma vida superior, permanecem contentes com as coisas boas que
perecem; e, portanto, se porventura desfrutam de alguma prosperidade material,
não se deixam influenciar por algum interesse por Deus. Consequentemente,
enquanto eles, segundo o procedimento dos animais inferiores, se apegam a
vários objetos, alguns de uma natureza, outros de outra, crendo encontrar neles
a suprema felicidade, Davi, com boas razões, se separa deles e propõe a si
mesmo uma finalidade de caráter totalmente oposto. Não quero insistir contra a
interpretação que imagina Davi, aqui, se queixando de seus próprios seguidores
que, percebendo que a força deles é insuficiente para suportar as necessidades
que lhes sobrevinham, e, exaustos pelo aborrecimento e tristeza, entregavam-se
às lamúrias e ansiosamente aspiravam sossego. Ao contrário, estou antes
inclinado a estender as palavras ainda mais e encará-las no sentido em que Davi,
satisfeito somente com o favor divino, protesta que desconsidera e não tem em
mínima conta os objetos que outros ardentemente desejam. Tal comparação da
aspiração de Davi com as aspirações do mundo ilustra muito bem esta importante
doutrina, a saber, que os fiéis, formando um baixo conceito das boas coisas da
presente vida, descansam tão-somente em Deus e nada têm por precioso além da
experiência pessoal e consciente de seu profundo interesse pelo favor divino.
Davi, pois, em primeiro lugar notifica que são insensatos todos aqueles que,
aspirando desfrutar de prosperidade, não começam pela busca do favor divino;
pois, ao negligenciar tal bênção, se deixam levar pelas diversas e falsas
opiniões em circulação. Em segundo lugar, ele censura outros vícios, a saber,
que os homens ordinários e terrenos, ao se entregarem totalmente ao bem-estar e
confortos da carne, se deleitam neles, ou os tomam como o seu único desfruto
nesta vida, sem ponderar em nada mais elevado. Daí também sucede que, enquanto
são supridos com outras coisas segundo seu desejo, são totalmente indiferentes
acerca de Deus, justamente como se não sentissem nenhuma necessidade dele.
Davi, ao contrário, testifica que, embora estivesse destituído de todas as
demais coisas desejáveis, o amor paternal de Deus era suficiente para compensar
a perda de todas elas. Eis, portanto, o sentido de tudo: “A maioria das pessoas
tentam alegremente alcançar os prazeres e as vantagens da presente vida; minha
tese, porém, é que a perfeita felicidade só se pode encontrar no favor divino”.
Deus
nos abençoe!
João
Calvino (1509-1564).
*Comentário
do Livro dos Salmos, Edições Paracletos.
*Visite a Igreja Presbiteriana Silva Jardim - Curitiba/PR.
Av. Silva Jardim, 4155 – Seminário.
(41)3242-8375
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