“A BÊNÇÃO APOSTÓLICA”
“A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do
Espírito Santo sejam com todos vós” (2Co 13.13).
O apóstolo Paulo termina a epístola com uma oração constituída de três
partes, nas quais está encerrado o todo de nossa salvação. Paulo deseja aos irmãos,
antes de tudo, a graça de Cristo, em
segundo lugar, o amor de Deus, em
terceiro, a comunhão do Espírito. O
termo “graça”, aqui, significa a bênção total da redenção. A ordem apresentada
pode parecer invertida, visto que o amor exerce a prioridade. Nem sempre há na
Escritura uma preocupação quanto à exatidão no arranjo dos termos, mas pode-se
também dizer que a ordem, aqui, concorda com a forma doutrinal exposta na Escritura,
segundo a qual nós, quando éramos inimigos de Deus, fomos reconciliados pela
morte de seu Filho (Rm 5.1), embora a Escritura geralmente fale disto de duas
formas diferentes. Às vezes ela fala na forma já citada, que havia inimizade
entre nós e Deus, até que fôssemos reconciliados por meio de Cristo. Por outro
lado, lemos em João 3.16 que “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu
Filho Unigênito”. Estas duas declarações parecem contradizer uma à outra, porém
é fácil reconciliá-las, pois na segunda, vemos pelo prisma de Deus, e na
primeira vemos pelo nosso próprio ponto de vista. Porque Deus, no tocante a ele
mesmo, nos amou desde antes da fundação do mundo e nos redimiu tão-somente
porque nos amou; porém nós, quando olhamos para nós mesmos, nada vemos senão
pecado a provocar a ira divina, e não podemos apropriar-nos do amor de Deus sem
um Mediador. Portanto, no tocante a nós, a graça de Cristo é o princípio do
amor de Deus. Examinando a questão na primeira forma, Paulo não estaria certo
pondo a graça de Cristo antes do amor de Deus, porque não se pode pôr o efeito
antes da causa; porém, do segundo ponto de vista, é correto começar com a graça
de Deus por meio da qual Ele nos adotou como seus filhos, e honrou com seu amor
àqueles a quem outrora mantinha sob a ira e abominação em razão do pecado.
A comunhão do Espírito é adicionada porque é somente sob a
direção do Espírito que tomamos posse de Cristo e de todos os seus benefícios.
Paulo parece também estar fazendo alusão à variedade dos dons do Espírito que ele
menciona em outras partes, visto que Deus não concede o Espírito a alguém como um indivíduo
isolado, senão que o distribui a cada um segundo a medida da graça, para que os
membros da igreja compartilhem seus dons uns com os outros e assim nutram sua
unidade.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).