“TODOS ESTES MORRERAM NA FÉ”
“Todos estes morreram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as,
porém, de longe, e saudando-as, e confessando que eram estrangeiros e
peregrinos sobre a terra” (Hb 11.13).
Vemos neste versículo o apóstolo magnificando a fé dos patriarcas ao modo de comparação; porque, embora tivessem apenas saboreado as promessas de
Deus, sentiram-se felizes com sua doçura e rejeitaram com desdém tudo que havia
no mundo; nem ainda esqueceram do sabor delas, por muito escasso que fosse,
seja na vida seja morte.
A frase, “morreram na fé”, se explica
de duas formas. Há quem simplesmente a entenda como significando que morreram
na fé em razão de que nesta vida jamais obtiveram as bênçãos prometidas, assim
como hoje, nossa salvação se encontra oculta de nós na esperança. Em
contrapartida, concordo com aqueles que creem que se deve observar aqui uma
certa diferença entre os pais e nós, o que exponho assim: Ainda que Deus haja
dado aos pais apenas um antegozo de seu favor, o qual é derramado generosamente sobre nós; e ainda que ele lhes haja mostrado apenas uma vaga
imagem de Cristo, como que à distância, o qual é agora posto diante de nossos
olhos para que o vejamos, todavia ficaram satisfeitos e nunca decaíram de sua
fé. Quão maior e mais justificável razão temos nós, hoje, para perseverarmos!
Se porventura fracassarmos, nos veremos duplamente sem escusa. Isso é ainda
mais enfatizado pelas circunstâncias, ou seja: que os pais viram o reino
espiritual de Cristo de longe, enquanto que essa visão se encontra tão próxima
de nós hoje. Eles saudaram de longe as promessas que hoje nos são tão familiares.
Se eles, apesar de tudo, perseveraram até à morte, quão imperdoável será nossa
indolência, caso nos cansemos de crer quando o Senhor nos socorre com tantos
recursos! Se alguém objetar, dizendo que não podiam ter crido sem ter obtido as
promessas, sobre as quais a fé se acha necessariamente fundamentada, respondo
que a expressão tem de ser tomada em termos de comparativos. Eles se
encontraram longe desse elevado estado no qual Deus nos estabeleceu. Ainda que
a mesma salvação lhes fora prometida, todavia as promessas não lhes foram
reveladas com a mesma clareza que desfrutamos no reino de Cristo, senão que se
contentaram em contemplá-las de longe.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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