“A NOSSA PÁTRIA
ESTÁ NOS CÉUS”
“O destino
deles é a perdição, o deus deles é o ventre, e a glória deles está na sua
infâmia, visto que só se preocupam com as coisas terrenas. Pois a nossa
pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus
Cristo” (Fp 3.19,20).
A nossa pátria está nos céus. Esta afirmação transtorna todas as vãs
exibições em que os pretensos ministros do evangelho costumam se vangloriar, e
indiretamente denuncia todos os objetivos que tinham em vista, porque, ao se
agitarem de um lado para o outro, não aspiravam ao céu. Pois o apóstolo Paulo ensina que não
se deve reconhecer nada como possuindo algum valor exceto o reino espiritual de
Deus, porque os crentes devem viver uma vida celestial neste mundo. “Eles
pensam nas coisas terrenas; por isso é conveniente que nós, cuja convivência
está no céu, vivamos separados deles”. É verdade que aqui nós estamos
misturados aos incrédulos e hipócritas; mais ainda, a palha, no celeiro do
Senhor, tem melhor aparência do que o trigo. Além disso, estamos expostos às
costumeiras inconveniências desta vida terrena; precisamos ainda de comida e
bebida e outras necessidades, mas devemos manter a convivência com o céu na
mente e nos afetos. Pois, de um lado, devemos passar serenamente por esta vida;
e, do outro, devemos estar mortos para o mundo para que Cristo viva em nós, e
para que, por nossa vez, vivamos para ele. Esta passagem é uma fonte mui
abundante de muitas exortações que podem ser detectadas com facilidade.
De onde também aguardamos o Salvador. Do
relacionamento que temos com Cristo ele prova que nossa cidadania está
vinculada ao céu, pois não é conveniente que os membros vivam separados de sua
Cabeça. Consequentemente, como Cristo está no céu, para que estejamos unidos a ele se faz necessário que, em espírito, habitemos fora
deste mundo. Além disso, “onde está nosso tesouro, aí também está nosso
coração” [Mt 6.21].
Cristo, que é
nossa bem-aventurança e glória, está no céu; que nossas almas, pois, habitem
com ele nas alturas. É por isso mesmo que o apóstolo Paulo expressamente o chama de Salvador.
Donde nos vem a salvação? Cristo nos virá do céu em sua função de Salvador.
Daí, seria inconveniente que fôssemos apreendidos por esta terra. Esta qualificação, Salvador, se ajusta bem à conexão da passagem; pois relata-se
que estamos no céu com respeito à nossa mente, ou, seja, que é tão-somente
dessa fonte que a esperança da salvação nos emana. Como a vinda de Cristo será
terrível para os perversos, assim ela desvia mais suas mentes do céu do que as
atrai para lá. Porquanto bem sabem que ele lhes virá em sua função de Juiz, por
isso se esquivam dele o máximo que podem. Destas palavras de Paulo as mentes
piedosas derivam a mais doce consolação, como a instrui-los de que a vinda de
Cristo deve ser desejada por eles, visto que ela lhes trará salvação. Em
contrapartida, é um emblema seguro de incredulidade quando as pessoas tremem
ante a mera menção dela. Examine-se o oitavo capítulo de Romanos. Entretanto,
enquanto outros se deixam transportar por várias aspirações, Paulo deseja que
os crentes vivam contentes unicamente com Cristo.
Ademais, desta
passagem aprendemos que não se deve pensar em nada vil ou terreno como [se
viesse] de Cristo, visto que Paulo nos convida a erguer os olhos para o céu a
fim de O buscar. Ora, aqueles que arrazoam com sutileza dizendo que Cristo não
está encerrado nem oculto em algum canto do céu, com vistas a provar que seu
corpo está em toda parte, e enche céu e terra, deveras dizem algo mui
verdadeiro, porém incompleto; pois como que, por temeridade e estultícia,
remontam para além dos céus e designam a Cristo uma posição, ou trono, ou lugar
de passeio, nesta ou naquela região, assim é uma tola e destrutiva demência
arrastá-lo do céu por alguma consideração carnal, a ponto de buscá-lo na terra.
Subamos, pois, com nossos corações, para que estejamos com o Senhor.
Deus nos
abençoe!
João Calvino (1509-1564).
*Visite a Igreja Presbiteriana Silva Jardim - Curitiba(PR).
Av. Silva Jardim, 4155 – Seminário.