“MUITAS VEZES ME ANGUSTIARAM”
“Muitas vezes me
angustiaram desde a minha mocidade, Israel que o diga” (Sl 129.1).
É bem provável
que este Salmo tenha sido escrito numa ocasião em que a Igreja de Deus,
reduzida a um estado de angústia extrema, ou desfalecida em face de um grande
perigo, ou oprimida com tirania, se via à beira de destruição total. É como se
o profeta quisesse dizer: Quando os fiéis de Deus se encontram em meio às
dificuldades que os abatem sob o fardo das provações, esse é um tempo oportuno
de refletirem sobre a maneira como Deus tem exercitado seu povo desde o
princípio, de geração em geração. Tão logo Ele solte as rédeas de nossos
inimigos, para que façam o que bem lhes agrade, somos perturbados com
tristezas, e nossos pensamentos, totalmente absorvidos pelos males que ora nos
embaraçam. Disso procede o desespero, pois não lembramos que a paciência dos
pais foi subjugada a uma provação semelhante e que não nos sucede nada que eles
não experimentaram. É um exercício eminentemente apropriado ao conforto dos
verdadeiros crentes o volverem seu olhar aos conflitos da Igreja nos dias de
outrora, para que, por meio disso, saibam que ela sempre labutou sob a cruz e
tem sido severamente afligida pela violência injusta de seus inimigos.
A conjectura mais
provável que me ocorre é que este Salmo foi escrito depois que os judeus
regressaram do cativeiro babilônico, quando, tendo sofrido muitos agravos e
injúrias cruéis nas mãos de seus vizinhos, quase desfaleceram sob a tirania de
Antíoco Epifãnio. Nesse estado de trevas e tribulações, o profeta encoraja os
fiéis a serem fortes, não se dirigindo apenas a uns poucos, mas a todo o corpo,
sem exceções. E, a fim de que fossem sustentados em assaltos tão ferozes, ele
desejava que demonstrassem em oposição a tais assaltos uma esperança inspirada
pela encorajadora consideração de que a Igreja, por meio de tolerância
paciente, tem se mostrado invariavelmente vitoriosa.
Quase cada
palavra contém ênfase. Israel que o diga,
ou seja, que ele considere as provações da Igreja nos tempos antigos; disso se
pode deduzir que o povo de Deus nunca foi isentado de levar a cruz e que as
várias aflições pelas quais têm sido provados sempre tiveram um resultado
feliz. Ao falar dos inimigos de Israel usando apenas o pronome eles, e não
sendo mais específico, o salmista agrava a severidade da aflição, mais do que
se houvesse chamado expressamente pelo nome os assírios ou os egípcios. Ao não
especificar qualquer classe particular de inimigos, ele notifica por meio do
silêncio que o mundo está saturado de inumeráveis bandos de inimigos, que
Satanás facilmente arma para a destruição dos homens bons, sendo o objetivo
dele que novas guerras surjam continuamente e de todos os lados. A história
certamente dá testemunho amplo de que o povo de Deus não tem enfrentado poucos
inimigos, e sim que têm sido atacado por quase todo o mundo; e, além do mais,
que foram molestados não só por inimigos externos, mas também por inimigos
internos, que professavam pertencer à Igreja.
Deus nos
abençoe!
João
Calvino (1509-1564).
*Visite a Igreja Presbiteriana do Brasil - Curitiba(PR).

Nenhum comentário:
Postar um comentário