“ANTES, ME RECEBESTES COMO ANJO DE DEUS”
“E, posto que a minha enfermidade na carne vos foi uma tentação,
contudo, não me revelastes desprezo nem desgosto; antes, me recebestes como
anjo de Deus, como o próprio Cristo Jesus” (Gl 4.14).
Diz o apóstolo Paulo aos Gálatas: E,
posto que a minha enfermidade na carne vos foi uma tentação, contudo, não me
revelastes desprezo nem desgosto, ou seja: “Ainda que percebestes que eu,
pelo prisma do mundo, não passava de um homem humilde, todavia não me
rejeitastes”. Ele a denomina de “tentação” ou “provação”, visto que era algo
desconhecido ou obscuro, e não conseguia ocultá-lo, como as pessoas ambiciosas
costumam fazer quando se sentem envergonhadas de sua pequenez. Às vezes sucede
que os indignos são aplaudidos antes que sua nudez seja percebida, mas logo
depois são descartadas em meio à vergonha e descrédito.
Antes, me recebestes como anjo de Deus. É assim que todo ministro de Deus deve ser
considerado. Porque, como Deus nos distribui suas graças pela atividade dos
anjos, assim os mestres piedosos são divinamente levantados para
administrar-nos a mais excelente de todas as bênçãos, ou seja, a doutrina da
salvação eterna. Portanto, aqueles por cujas mãos Deus nos dispensa um tesouro de
tal natureza são merecidamente comparados a anjos. Além disso, eles são os
mensageiros de Deus, por cujos lábios Deus nos fala. E esse argumento se
encontra em Malaquias 2.7.
Mas Paulo se eleva ainda mais e acrescenta: como o próprio Cristo Jesus. Porquanto
o próprio Senhor ordena que seus ministros sejam considerados assim como ele é:
“Quem vos der ouvidos, ouve a mim, e quem vos rejeitar, a mim me rejeita” [Lc
10.16]. E não é para menos! Pois é em seu lugar que se desincumbem de sua
embaixada. E assim executam a parte daquele em lugar de quem eles agem. Esses
são seus louvores com os quais a majestade do evangelho nos é exibida e seu
ministério adornado. Se é a ordem de Cristo que seus ministros sejam assim
honrados, é indubitável que desprezá-los é algo que procede da instigação do
diabo. E deveras jamais poderão ser desprezados enquanto a Palavra de Deus for
dignificada. Os que querem ser honrados como anjos devem desempenhar o papel
dos anjos. Os que querem ser ouvidos como Cristo o é, então que fielmente
mantenham imaculada a sua Palavra.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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