“Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede que não sejais mutuamente destruídos. Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne” (Gl 5.15,16).
À luz da natureza do tema, tanto quanto das palavras, é possível
conjecturarmos que os gálatas tinham desavenças entre si; pois diferiam em
matéria de doutrina. O apóstolo Paulo agora demonstra, à luz do resultado, quão
destrutivo é um mal desse gênero no seio da Igreja. Portanto, é possível que o
Senhor haja punido sua ambição, orgulho e outros pecados com o ingresso de
falsas doutrinas. Tal coisa se pode inferir à luz do que é costumeiro e à luz
da declaração de Moisés em Deuteronômio 13.3.
Pelos termos morder e devorar, o apóstolo, a meu ver, tem em mente
as calúnias, as acusações, brigas e outros tipos de discórdias verbais, bem
como atos de injustiça oriundos ou da fraude ou da violência. E qual é o fim
deles? Ser destruídos, diz Paulo. A
propriedade do amor, porém, é a mútua proteção e bondade. Recordemos sempre,
quando o diabo nos empurrar para as controvérsias, que as desavenças dos
membros no seio da Igreja, não nos levam a parte alguma, senão para a ruina e
destruição de todo o corpo. Quão desditoso, quão louco é que nós, membros do
mesmo corpo, conspiremos voluntariamente e de comum acordo para a mútua destruição?
A ruína da
Igreja não é um mal de somenos importância. Portanto, seja o que for que a
ameace, deve ser resistido com determinação. Mas, com que método? Quando a
carne não exerce domínio sobre nós, e quando nos sujeitamos ser governados pelo
Espírito de Deus. O apóstolo insinua que os gálatas eram carnais, destituídos
do Espírito de Deus e que viviam uma vida indigna de cristãos. Pois, donde
sucede que atacavam uns aos outros, senão do fato de que eram guiados pelas
concupiscências da carne? Tal coisa, diz ele, é sólida evidência de que não
andavam segundo o Espírito.
Devemos atentar para a expressão, jamais satisfareis. Paulo a usa no seguinte sentido: ainda que os filhos de Deus estejam sujeitos a pecar enquanto gemem sob o fardo da carne, todavia não são seus vassalos ou escravos, senão que se esforçam por resistir o pecado. O homem espiritual não está isento das concupiscências da carne e seus constantes apelos, porém não se curva para permitir que reinem sobre ele.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
Nenhum comentário:
Postar um comentário