“DESDE A MINHA MOCIDADE”
“Desde a minha mocidade, me angustiaram, todavia, não prevaleceram
contra mim” (Sl 129.2).
O termo mocidade denota os primórdios do povo,
referindo-se não só ao tempo em que Deus tirou o povo do Egito, mas também ao
tempo em que ele usou Abraão e os patriarcas durante quase toda a sua vida,
mantendo-os numa condição de luta árdua. Se esses patriarcas tiveram de andar
como estrangeiros na terra de Canaã, a sorte de seus descendentes foi ainda
pior durante o tempo de sua permanência no Egito, quando foram oprimidos como
escravos e afligidos por toda sorte de opróbrio e ignomínia. Em sua partida
daquela terra, sabemos quantas dificuldades tiveram de enfrentar.
Se, ao considerarmos a história deles desde aquele período, nos
depararmos com ocasiões em que se lhes tributou algum respeito, observaremos
que eles nunca viveram num estado de tranquilidade, por qualquer extensão de
tempo, até ao reinado de Davi. E, embora durante o reinado de Davi eles
aparentassem viver numa condição próspera, logo surgiam tribulações e derrotas,
as quais ameaçavam o povo de Deus com total destruição. No cativeiro
babilônico, sendo toda esperança quase extinta, pareciam como que ocultos no
túmulo e antecipando o processo de putrefação. Após o seu regresso, foi com
dificuldade que obtiveram alguma breve intermissão, para tomarem fôlego. Por
certo, às vezes eles eram entregues à espada, até que sua raça era quase
totalmente destruída. Se olharmos para nós mesmos, é oportuno acrescentar as
terríveis perseguições pelas quais a Igreja teria sido consumida milhares de
vezes, se Deus não a houvesse preservado, por meios ocultos e misteriosos,
ressuscitando-a, por assim dizer, dentre os mortos. A menos que nos tornemos
estúpidos, quando afligidos por nossas calamidades, as circunstâncias aflitivas
desta era desditosa nos compelirão a meditar sobre essa mesma doutrina.
Quando o profeta diz, me angustiaram, a repetição não é
supérflua. A intenção é ensinar-nos que o povo de Deus enfrentou conflitos não
somente uma vez ou duas e que sua paciência foi testada por disciplinas
contínuas. Ele dissera que esse conflito começara desde a
mocidade, sugerindo que estavam habituados ao conflito desde a mais tenra
origem, a fim de que se acostumassem a carregar a cruz. Então, ele acrescenta
que, ao se sujeitarem a este rigoroso treinamento, não o fizeram sem uma boa
razão, visto que Deus não cessara de fazer uso das calamidades para submetê-los
a Si mesmo. Se as disciplinas da Igreja, durante seu período de infância, eram
tão severas, nossa debilidade será realmente vergonhosa, se nos dias atuais,
quando a Igreja, por meio da vinda de Cristo, alcançou a era da maturidade,
formos achados sem firmeza para suportar as provações. Fonte de consolação é a
última sentença, que nos informa que os inimigos de Israel, após haverem
tentado todos os métodos, nunca tiveram êxito em concretizar seus desejos,
visto que Deus sempre frustrou as esperanças dos inimigos e abafou suas
tentativas.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
*Visite a Igreja Presbiteriana do Brasil - Curitiba(PR).

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