“MAS SOCORRE A DESCENDÊNCIA DE ABRAÃO”
“Pois ele, evidentemente, não socorre anjos,
mas socorre a descendência de Abraão” (Hb 2.16).
Ao traçar esta comparação, o apóstolo estende
os benefícios e a honra que Cristo nos comunicou, revestindo-se de nossa carne,
já que ele jamais fez algo semelhante em favor dos anjos. Visto que se fazia
necessário encontrar um antídoto infalível para a terrível ruína humana, o
Filho de Deus se propôs oferecer-nos uma incomparável demonstração de seu amor
para conosco, tal que nem mesmo os anjos participaram. O fato de nos preferir
aos anjos não teve por base nossa excelência, e sim, nossa miséria. Não há razão
para vangloriarmo-nos de que somos superiores aos anjos, exceto de que o Pai
celestial nos concedeu maior benevolência em razão de sermos carentes dela,
para que os próprios anjos, lá do alto, contemplassem tão sublime generosidade
derramada sobre a terra.
Só esta passagem seria suficiente para
confundir os que negaram que Cristo verdadeiramente nasceu de geração humana.
Se ele apenas assumisse a aparência de homem, tendo anteriormente aparecido
repetidas vezes na forma de um anjo, então não teria havido distinção alguma.
Uma vez, porém, que não se pode dizer que Cristo se convertera realmente em
anjo, vestido com a natureza angélica, assim diz-se que ele assumira a natureza
humana, e não a natureza angélica. O apóstolo está falando de natureza,
e mostra que, quando Cristo se vestiu de nossa carne, se fez homem genuíno,
para que houvesse unidade de pessoa em duas naturezas. Além do mais, esta
passagem não oferece apoio aos que inventaram um duplo Cristo, como se o Filho
de Deus não fosse genuinamente homem, senão que apenas viveu na carne humana.
Descobrimos que tal conceito é muitíssimo diferente daquela posição do
apóstolo. Seu alvo é ensinar-nos que na pessoa do Filho de Deus encontramos
um Irmão em virtude da comunhão de nossa comum natureza. Ele,
portanto, não se contenta em apenas chamá-lo Homem, mas afirma que
ele nasceu de descendência humana. Ele expressamente chama de “descendência de
Abraão”, para que tivéssemos mais fé no que ele diz, visto que o extraiu da
própria Escritura.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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