“Porém o homem
espiritual julga todas as coisas, mas ele mesmo não é julgado por ninguém” (1Co
2.15).
Tendo o
apóstolo Paulo anulado a capacidade do homem natural de julgar as coisas do
Espírito, ele agora ensina que só os espirituais são juízes capazes desta
matéria; porque só o Espírito de Deus conhece a si mesmo, e é sua função
pessoal separar suas próprias coisas das dos outros; para aprovar o que é propriamente
seu e despir tudo o mais de qualquer probidade. Portanto, o significado é o
seguinte: “Nesta conexão, não existe lugar para o discernimento da carne! É
tão-somente o homem espiritual que possui esse conhecimento, firme e saudável,
dos mistérios de Deus; é ele quem de fato distingue verdade e falsidade; o
ensino de Deus das invenções humanas; e os seus equívocos são diminutos”. Em
contrapartida, “ninguém o julga”, porque a certeza de fé não se acha sob o
controle humano, como se pudesse ser reduzida a ruínas a seu bel-prazer,
quando, de fato, é ela superior aos próprios anjos. Note-se que essa
prerrogativa é atribuída não ao homem pessoalmente, mas à Palavra de Deus, a
qual usa os espirituais como guias quando estão julgando, e a qual,
naturalmente, lhes é elucidada por Deus, para que possam entender. Quando isto
se dá, a convicção do homem se faz inabalável, porque ela está acima das
ambiguidades do juízo humano.
Ademais,
observe-se a palavra julgar. O que o
apóstolo quer significar com ela é só que somos iluminados pelo Espírito para
recebermos a verdade, mas que somos igualmente equipados com o espírito de
discernimento a fim de não vivermos suspensos pela dúvida entre a verdade e a
falsidade, mas para sermos capazes de decidir o que devemos evitar o que
devemos seguir.
Neste ponto,
porém, podemos formular a seguinte pergunta: quem é este homem espiritual, e
onde havemos de encontrá-lo munido de tanta luz que se torna capaz de a tudo
julgar, quando estamos bem conscientes do fato de que estamos cercados por um
grande contingente de ignorância, e sujeitos ao risco de cairmos em erros, e, o
que é ainda mais sério, quando ainda o mais excelente dos homens repentinamente
fracassa? A resposta é fácil: Paulo não faz esta capacidade aplicável a todos,
como se ele isentasse a todos os que são renovados pelo Espírito de Deus de
todo o gênero de erro; mas simplesmente deseja ensinar que a inteligência
humana é inútil para avaliar os ensinos da religião, e que a prerrogativa de
julgar, segundo este critério, pertence exclusivamente ao Espírito de Deus.
Portanto, um homem só julga corretamente e com segurança pelo prisma de seu
novo nascimento e segundo a medida da graça a ele concedida - e não mais!
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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