“PARA AGUARDARDES
DOS CÉUS O SEU FILHO”
“E para aguardardes
dos céus o seu Filho, a quem ele ressuscitou dentre os mortos, Jesus, que nos
livra da ira vindoura” (1Ts 1.10).
A doutrina do evangelho visa a nos induzir a servir e obedecer a Deus. Ninguém é propriamente convertido a Deus, senão o homem que aprendeu a colocar-se totalmente em sujeição a ele. Contudo, como isto é algo simplesmente mais do que difícil, em tão grande corrupção da nossa natureza, ao mesmo tempo o apóstolo Paulo revela o que é que nos retém e nos confirma no temor a Deus e na obediência a ele – aguardar dos céus a Cristo. Pois, a menos que sejamos despertados para a esperança da vida eterna, o mundo rapidamente nos atrairá a si. Pois, assim como é apenas a confiança na bondade divina que nos induz a servir a Deus, do mesmo modo é apenas a expectativa da redenção final que nos impede de recuarmos. Portanto, que todos os que desejam perseverar em um curso de vida santa apliquem toda a sua mente à expectativa da vinda de Cristo. Pois, certamente, sem Cristo estamos arruinados e entregues ao desespero, mas, quando Cristo se revela, a vida resplandece para nós. Tenhamos em mente, porém, que isto é dito exclusivamente aos crentes, pois, quanto aos ímpios, assim como ele virá para ser seu Juiz, do mesmo modo eles só podem tremer ao esperá-lo. É isto que Paulo acrescenta na sequência – que Cristo nos livra da ira vindoura. Pois isto não é sentido senão por aqueles que, estando reconciliados com Deus pela fé, já têm a consciência apaziguada; do contrário, seu nome é terrível. É verdade que Cristo nos livrou pela sua morte da ira de Deus, mas a importância desse livramento se tornará visível no último dia. No entanto, esta afirmação consiste de duas seções. A primeira é que a ira de Deus e a destruição eterna são iminentes à raça humana, porquanto todos pecaram, e destituídos estão da glória de Deus (Rm 3.23). A segunda é que não existe meio de escape senão através da graça de Cristo; pois não é sem bons motivos que Paulo lhe atribui este ofício. Contudo, é um dom inestimável que os que são piedosos, sempre que é feita menção ao juízo, saibam que Cristo virá para eles como um Redentor.
Além disso, o apóstolo afirma enfaticamente: a ira vindoura, para despertar as mentes piedosas, para que não fracassem ao considerar a vida presente. Pois, assim como a fé é a convicção de fatos que se não veem (Hb 11.1), nada é menos adequado do que estimarmos a ira de Deus de acordo com o que cada um é afligido no mundo; assim como nada é mais absurdo do que nos apegarmos às bênçãos transitórias de que desfrutamos, para que por elas tenhamos uma estimativa do favor de Deus. Portanto, enquanto, por um lado, os ímpios se divertem à vontade, e nós, por outro, definhamos em miséria, aprendamos a temer a vingança de Deus, que está oculta aos olhos da carne.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).