“REGOZIJAI-VOS SEMPRE. ORAI SEM CESSAR. EM TUDO, DAI GRAÇAS”
“Regozijai-vos
sempre. Orai sem cessar. Em tudo, dai graças, porque esta é a vontade de Deus
em Cristo Jesus para convosco” (1Ts 5.16-18).
Regozijai-vos
sempre. Refiro isto à moderação de
espírito, quando a mente se mantém calma sob a adversidade, e não dá lugar à
tristeza. Concordemente, relaciono estas três coisas entre si: regozijar-se sempre, orar sem cessar e em tudo dar graças. Pois, quando
recomenda a oração constante, o apóstolo Paulo aponta o meio de se regozijar
perpetuamente, porque através deste meio pedimos a Deus alívio em relação a
todas as nossas aflições. De modo semelhante, em Filipenses 4.4, tendo dito: “Regozijai-vos sempre no Senhor; outra vez
digo, regozijai-vos. Seja a vossa moderação notória a todos. Não estejais
inquietos por coisa alguma. Perto está o Senhor”, ele indica a seguir o
meio para isto: “antes as vossas petições
sejam em tudo conhecidas diante de Deus, com ação de graças”.
Nessa
passagem, como sabemos, o apóstolo apresenta como fonte de alegria uma mente calma e
serena, que não é excessivamente perturbada por injúrias ou adversidades. Mas,
para que não sejamos abatidos pela aflição, tristeza, ansiedade e temor, ele
nos manda descansarmos na providência de Deus. E, como frequentemente se
introduzem dúvidas quanto a se Deus cuida de nós, também prescreve o remédio –
que, pela oração, descarreguemos nossas ansiedades como que em seu seio, como
Davi nos recomenda a fazer em Sl 37.5 e Sl 55.22; e Pedro também, conforme o
seu exemplo (1Pe 5.7). Como, porém, somos excessivamente precipitados em nossos
desejos, ele impõe um freio sobre eles – que, embora desejemos aquilo de que
precisamos, ao mesmo tempo não deixemos de dar graças.
Paulo observa, aqui, praticamente a mesma ordem, embora em menos palavras. Pois, antes de tudo, queria que tivéssemos os benefícios de Deus em tanta estima que o reconhecimento deles e a meditação sobre eles superassem toda a tristeza. E, sem sombra de dúvida, se consideramos o que Cristo nos concedeu, não haverá amargura de tristeza tão intensa que não possa ser aliviada, e dê lugar à alegria espiritual. Pois, se esta alegria não reina em nós, o reino de Deus é ao mesmo tempo banido de nós, ou nós dele. E muito ingrato a Deus é o homem que não dê um valor tão elevado à justiça de Cristo e à esperança da vida eterna, regozijando-se em meio à tristeza. Como, porém, nossas mentes são facilmente abatidas, até que deem lugar à impaciência, devemos observar o remédio que ele prescreve logo após. Pois, ao sermos derribados e abatidos, somos novamente levantados pelas orações, porque colocamos sobre Deus o que nos sobrecarregava. Como, porém, a cada dia, sim, a cada instante, há muitas coisas que podem perturbar a nossa paz, e frustrar a nossa alegria, por esta causa ele nos manda orar sem cessar. Ação de graças, conforme disse, é acrescentada como uma limitação. Pois muitos oram de tal modo que ao mesmo tempo murmuram contra Deus, e se queixam de que ele não gratifique imediatamente seus desejos. Mas, pelo contrário, é conveniente que nossos desejos sejam refreados de tal modo que, contentes com o que nos é dado, sempre misturemos ações de graças aos nossos desejos. É verdade que podemos licitamente pedir, sim, suspirar e lamentar, mas isto deve ser de tal modo que a vontade de Deus seja mais aceitável a nós do que a nossa própria.
Pois esta é a
vontade de Deus. Deus possui tal disposição para
conosco em Cristo que mesmo em nossas aflições temos grande oportunidade de dar
graças. Pois, o que é mais justo e mais apropriado para nos apaziguar, senão
quando sabemos que Deus nos abraça em Cristo tão ternamente, que ele torna em
nosso benefício e felicidade todas as coisas que nos ocorrem? Portanto,
tenhamos em mente que este é um remédio especial para corrigir a nossa
impaciência – desviar nossos olhos de contemplar os males presentes que nos
atormentam, e direcionar nossa vista a uma consideração de natureza diferente:
como Deus permanece favorável a nós em Cristo.
Deus nos
abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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