“De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que
aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador
dos que o buscam” (Hb 11.6).
A razão por que ninguém pode agradar a Deus sem o exercício
da fé consiste nisto: ninguém jamais se aproxima de Deus se não crer que ele
existe e estiver convencido de que é o
Galardoador dos que o buscam. Se o caminho para Deus só é aberto para a fé,
segue-se que todos quantos se encontram fora da fé não podem agradar a Deus. A
partir desse fato, o apóstolo mostra, em primeiro lugar, como a fé obtém o
favor [divino] para nós, visto que ela é nossa mestra que nos orienta na
adoração ao verdadeiro Deus; e, em segundo lugar, porque ela nos faz mais
seguros da munificência divina, para que não nos pareça que o buscamos em vão.
A primeira vista, a exigência do apóstolo para crermos na existência de
Deus não se nos afigura como uma questão de primeira grandeza. Se você, porém,
fizer uma observação mais minuciosa, descobrirá que ela contém uma rica,
profunda e sublime doutrina. Ainda que a existência de Deus seja uma doutrina
que desfruta do consenso quase que universal e sem disputa, não obstante, a
menos que o Senhor nos dê um sólido conhecimento de si mesmo, toda sorte de
dúvidas nos assaltará para extinguir toda a nossa percepção do Ser divino. O
intelecto humano é particularmente inclinado a esse gênero de vacuidade, de tal
modo que se torna fácil esquecer-se de Deus. O apóstolo não está dizendo simplesmente
que os homens devam ser persuadidos de que é possível a existência de algum
gênero de deus, senão que ele está fazendo referência direta ao verdadeiro
Deus. Repito, não será bastante que formulemos uma vaga ideia de Deus, senão
que temos que discernir quem é o Deus verdadeiro.
Agora percebemos o que o apóstolo tencionava nesta cláusula. Ele afirma
que não teremos acesso à presença de Deus, a menos que estejamos convencidos,
nos mais profundos recessos de nossa alma, que Deus de fato existe, para que
não sejamos levados de um lado para outro por toda sorte de opiniões. É
evidente, à luz desse fato, que os homens cultuarão a Deus inutilmente, se
porventura não observarem o modo correto; e que todas as religiões que não
contêm o genuíno conhecimento de Deus são não só fúteis, mas também
perniciosas, visto que todas aquelas que não sabem distinguir Deus dos ídolos
estão sendo impedidas de se aproximarem dele. Não pode haver religião alguma
onde não reine a verdade. Se um genuíno conhecimento de Deus habita os nossos
corações, seguir-se-á inevitavelmente que seremos conduzidos a reverenciá-lo e
a temê-lo. Não é possível ter um genuíno conhecimento de Deus exceto pelo prisma
de sua majestade. É desse fator que nasce o desejo de servi-lo.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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