“NO TOCANTE A DAR E RECEBER”
“E sabeis
também vós, ó filipenses, que, no início do evangelho, quando parti da
Macedônia, nenhuma igreja se associou comigo no tocante a dar e receber, senão
unicamente vós outros; porque até para Tessalônica mandastes não somente uma
vez, mas duas, o bastante para as minhas necessidades” (Fp 4.15,16).
E sabeis também vós. Entendo isto como
um acréscimo ao modo de desculpa, visto que com frequência o apóstolo Paulo recebia algo da parte
deles, pois se as outras igrejas não cumpriam seu dever, poderia parecer como
se ele estivesse ansioso demais em receber. Daí, ao ser claro, ele os elogia;
e, elogiando, modestamente desculpa os outros. Nós também, segundo o exemplo do apóstolo, devemos atentar bem para que os santos, vendo-nos tão inclinados a
receber de outrem, não tenham boas razões de nos considerar insaciáveis. E sabeis também vós, diz ele. “Não espero que convoquem outra testemunha, porquanto
vocês mesmos sabem”. Pois frequentemente sucede que, quando alguém pensa que
outros são deficientes no cumprimento dos deveres, essa pessoa é a mais liberal
em prestar assistência. Assim a liberalidade de alguns escapa à observação de
outros.
No tocante a dar e receber. Paulo faz referência a questões
pecuniárias nas quais há duas partes: uma de receber, a outra de dar. É necessário que
estas sejam trazidas a uma equidade por compensação mútua. Há uma conta desta
natureza pendente entre Paulo e as igrejas. Enquanto Paulo lhes ministrava o evangelho, havia
certa obrigação envolvendo-os, em troca, no suprimento do que era necessário
para o sustento de sua
vida, como ele diz em outro lugar: “Se nós semeamos para vós as coisas
espirituais, será muito que de vós colhamos as materiais?” [1Co 9.11]. Daí, se
outras igrejas aliviavam as necessidades de Paulo, não lhe estariam dando nada
de graça, mas estariam simplesmente pagando sua dívida, pois deveriam
reconhecer que lhe estavam endividados pelo evangelho. Entretanto, ele
reconhece que este não fora o caso, visto que não haviam depositado nada em sua
conta. Que vil ingratidão, e quão inconveniente era tratar com negligência um
apóstolo como este, para com o qual bem sabiam estar em obrigação além de seu
poder de cumprir! Em contrapartida, quão grande tolerância deste santo homem em
suportar a desumanidade deles com tanta mansidão e indulgência, a ponto de não
fazer uso de uma palavra cortante sequer para acusá-los!
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
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