“FORÇAS ESPIRITUAIS DO MAL”
O apóstolo Paulo põe diante dos efésios o perigo, expressando-lhes a natureza
do inimigo. Sua intenção é fazer-nos ver que nossas dificuldades são maiores do
que se tivéssemos que lutar contra homens. Ali resistimos a força humana, o
homem contende com o homem, a força é rebatida pela força, e habilidade contra
habilidade; mas, aqui, o caso é muitíssimo diferente, porquanto nossos inimigos
são em tal proporção, que não há poder humano capaz de resistir. A luta não é
corporal.
Lembremo-nos
desta afirmação quando as injúrias humanas nos levarem à represália. Pois nossa
natureza nos leva à selvageria contra os próprios homens; mas esse estulto
desejo será refreado, como por uma rédea curta, pela consideração de que os
homens que nos importunam nada são além de dardos lançados pela mão de Satanás.
Enquanto estamos ocupados em repeli-los, nos expomos a ser feridos de todos os
lados. Lutar contra a carne e o sangue não só será inútil, mas também prejudicial.
Devemos ir diretamente ao inimigo, que nos ataca e nos fere de seu esconderijo,
que mata antes mesmo de ser visto.
O apóstolo põe
diante de nós um inimigo perigoso, não para infundir-nos medo, mas para aguçar
nossa diligência. Ao falar do poder do inimigo, Paulo se esforça por manter-nos
mais atentos. Ele já o denominara de diabo, mas agora usa uma série de epítetos,
para que os crentes pudessem entender que esse não é um inimigo a ser tratado
com descaso.
Ele o chama de principados e potestades, de dominadores deste mundo tenebroso. Sua intenção é mostrar-nos que o diabo reina
no mundo, porquanto o mundo outra coisa não é senão tenebrosidade. Daí segue-se
que a corrupção do mundo cede espaço as forças espirituais do mal. Paulo não
está aqui atribuindo aos demônios um principado, do qual se apoderam sem o
devido consentimento e o exercem em oposição a Deus, e sim, o atribui àquele
que, como a Escritura ensina, Deus, em justa vingança, permite que ajam contra
os perversos. A questão aqui é a seguinte: não propriamente que espécie de
poder os demônios exercem em oposição a Deus, e sim, quão assustadores eles se
nos tornam, com o fim de manter-nos sempre em guarda. Nem tampouco essas
palavras pretendem favorecer a crença de que o diabo criou e mantém para si
mesmo a região intermédia nos ares. Paulo não lhes designa um território fixo,
do qual se apoderam e o qual controlam, mas simplesmente indica que estão
imbuídos de hostilidade e se encontram nas regiões mais elevadas.
Deus nos abençoe!
João Calvino
(1509-1564).
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