“POIS SOMOS FEITURA DELE”
“Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as
quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Ef 2.10).
O apóstolo Paulo prova o que diz, ou seja, que somos salvos pela graça,
dizendo que nenhuma obra nos é de alguma utilidade para merecermos a salvação,
porque todas as boas obras que porventura possuímos são os frutos da
regeneração. Daí, segue-se que as próprias obras são uma parte da graça. Ao
dizer que somos obra de Deus, sua intenção não é considerar a criação em geral,
por meio da qual as pessoas nascem, senão que assevera que somos novas
criaturas, as quais são formadas para a justiça pelo poder do Espírito de
Cristo, e não pelo nosso próprio. Isso se aplica somente no tocante aos
crentes, os quais, ainda que nascidos de Adão, ímpios e perversos, são
espiritualmente regenerados pela graça de Cristo, e então começam ser um novo
homem. Portanto, tudo quanto em nós é porventura bom, provém da obra
supernatural de Deus. E segue-se uma explicação; pois ele adiciona que somos
obra de Deus em razão de sermos criados, não em Adão, mas em Cristo, e não para
qualquer tipo de vida, mas para as boas obras.
E agora, o que fica para o livre-arbítrio, se todas as boas obras que de
nós procedem foram comunicadas pelo Espírito de Deus? Que os piedosos avaliem
prudentemente as palavras do apóstolo. Ele não diz que somos assistidos por
Deus. Ele não diz que a vontade é preparada e que, então, age por sua própria
virtude. Ele não diz que o poder de escolher corretamente nos é conferido e que
temos, a seguir, de fazer nossa própria escolha. Esse é o procedimento daqueles
que tentam enfraquecer a graça de Deus (até onde podem), os quais estão
habituados a falsear a verdade. Mas o apóstolo diz que somos obra de Deus, e
que tudo quanto de bom exista em nós é criação dele. O que ele pretende dizer é
que o homem como um todo, para ser bom, tem de ser moldado pelas mãos divinas.
Não a mera virtude de escolher corretamente, nem alguma preparação indefinida,
nem assistência, mas é a própria vontade que é feitura divina. De outro modo, o
argumento de Paulo seria sem sentido. Ele tenciona provar que o homem de forma
alguma busca a salvação por sua própria iniciativa, mas que a adquire
gratuitamente da parte de Deus.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
Nenhum comentário:
Postar um comentário