"SER CRISTÃO É TER MENTE E CORAÇÃO DE CRISTO".



quarta-feira, 31 de julho de 2024

"MANTÉM O PADRÃO DAS SÃS PALAVRAS"


"MANTÉM O PADRÃO DAS SÃS PALAVRAS"

”Mantém o padrão das sãs palavras que de mim ouviste com fé e com o amor que está em Cristo Jesus” (2Tm 1.13).

Alguns tomam essa expressão, “mantém o padrão”, no seguinte sentido: “Que a tua doutrina seja um exemplo a que todos possam imitar”. Eu, porém, não a aceito nesse sentido. Meu ponto de vista pessoal é que o apóstolo Paulo está dizendo a Timóteo que guardasse firme a doutrina que havia aprendido, não só em sua substância, mas também na própria forma de sua expressão. Pois o termo usado aqui, significa um quadro vívido, como se o objeto envolvido estivesse realmente diante de seus olhos. Paulo sabia quão inclinados são os homens à rebeldia e apostasia da sã doutrina; por essa razão ele prudentemente exorta Timóteo a não se apartar da forma de ensino que havia aprendido, e a ajustar seu método desse ensino à regra estabelecida pelo apóstolo - não que ele fosse excessivamente escrupuloso acerca de palavras, mas porque é terrivelmente danoso corromper a doutrina, mesmo que em grau mínimo. À luz desse fato podemos entender o valor da teologia de várias igrejas, porquanto ela se degenerou tanto do padrão que Paulo aqui recomenda, que se assemelha mais a enigmas de adivinhos e prognosticadores do que com o ensino que tem por base a Palavra de Deus. Que indícios paulinos, pergunto, há nos púlpitos? Essa libertina corrupção doutrinal revela quão sábio fora Paulo em dizer a Timóteo que conservasse sua forma original.

Paulo acrescentou esse elemento distintivo da sã doutrina, com fé e com o amor, com o propósito de deixar-nos cientes de qual é o seu conteúdo e como ela pode se sumariada, e inclui tudo isso, segundo seu hábito, sob a fé e o amor. Ele coloca a ambos em Cristo como seu fundamento, visto que o conhecimento de Cristo consiste primordialmente dessas duas partes, porque, ainda que a expressão, que há, está no singular e concorda com a palavra amor, a mesma dever ser subentendida como aplicável igualmente à fé. Ninguém pode perseverar na sã doutrina sem que seja revestido de fé e amor sincero. Paulo usa essas duas palavras com o fim de explicar mais claramente quais são as “sãs palavras” e do quê elas tratam. Ele declara que toda a sua doutrina consiste de fé e amor, os quais têm sua fonte e fundamento no conhecimento de Cristo.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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Av. Silva Jardim, 4155 – Seminário. 

terça-feira, 30 de julho de 2024

“PORQUE SEI EM QUEM TENHO CRIDO”


“PORQUE SEI EM QUEM TENHO CRIDO”

“E, por isso, estou sofrendo estas coisas; todavia, não me envergonho, porque sei em quem tenho crido e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele Dia” (2Tm 1.12).

Eis aqui o único refúgio para onde todos os crentes devem fugir quando o mundo os condena como perdidos e infelizes, ou seja, que devem ter por suficiente o fato de poderem contar com a aprovação divina; pois o que seria deles caso depositassem nos homens sua confiança? Desse fato devemos inferir que há grande diferença entre a fé e a mera opinião humana. A fé não depende da autoridade humana, tampouco é uma confiança hesitante e dúbia em Deus; ela tem de estar associada ao conhecimento, do contrário não será bastante forte contra os intermináveis assaltos que Satanás lhe faz. O homem que, como Paulo, possui tal conhecimento saberá de experiência própria que nossa fé é corretamente chamada “a vitória que vence o mundo” [1Jo 5.4), e que Cristo tinha boas  razões para dizer que “as portas do inferno não prevalecerão contra ela” [Mt 16.18]. Tal homem será capaz de repousar tranquilamente mesmo em meio às tormentas e tempestades deste mundo, visto que alimenta uma confiança inabalável de que Deus, que não pode mentir ou enganar, falou, e o que ele prometeu, certamente cumprirá. Por outro lado, o homem que não tem essa verdade indelevelmente gravada em sua mente será sempre movido de um lado a outro como um arbusto agitado pelo vento. Esta passagem merece nossa detida atenção, pois ela explica de uma forma muitíssimo excelente o poder da fé, quando demonstra que, mesmo em casos extremos, devemos glorificar a Deus por não duvidarmos que ele se manterá verdadeiro e fiel e por aceitarmos sua Palavra com a mesma certeza como se Deus mesmo surgisse do céu diante de nós. O homem carente de tal convicção nada entende. É preciso que tenhamos sempre em mente que Paulo não está a filosofar no escuro, senão que, com a própria realidade diante dos olhos, está solenemente declarando o grande valor daquela confiante certeza da vida eterna.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“DESIGNADO PREGADOR, APÓSTOLO E MESTRE”


“DESIGNADO PREGADOR, APÓSTOLO E MESTRE”

"Para o qual eu fui designado pregador, apóstolo e e mestre" (2Tm 1.11).

O apóstolo Paulo tem boas razões para recomendar o evangelho de uma forma tão sublime juntamente com o seu próprio apostolado. Satanás trabalha muito mais do que imaginamos para banir de nossas mentes, por todos os meios possíveis, a fé na sã doutrina; e visto que nem sempre é fácil fazer isso através de um franco ataque à nossa fé, ele se arma contra nós secretamente e pelo uso de métodos indiretos; e a fim de destruir a credibilidade do correto ensino, ele desperta suspeitas acerca da vocação dos santos e mestres. Por isso Paulo, tendo a visão da morte ante seus olhos, e conhecendo bem as tramas bem articuladas de Satanás, determinou asseverar tanto o ensino do evangelho em geral quanto a necessidade de sua própria vocação. Ambas as coisas eram necessárias, pois ainda que apresentemos longos discursos acerca da dignidade do evangelho, os mesmo não nos seriam de muito valor, a menos que compreendamos o que o evangelho significa. Muitos darão seu assentimento ao princípio geral da autoridade indiscutível do evangelho, e não obstante ainda não terão nenhuma ideia definida do que se comprometeram seguir. Eis a razão por que Paulo deseja ser explicitamente reconhecido como fiel e legítimo ministro dessa doutrina vivificante, da qual ele estava justamente trazendo-lhes à memória; eis por que ele descreve a si próprio com os títulos de pregador, apóstolo e mestre. Ele se denomina de pregador [arauto], cujo dever é fazer públicos os decretos dos príncipes e magistrados. O título, apóstolo, lhe pertence de forma restrita; e visto que há uma relação especial entre um mestre e seus alunos, ele se descreve lançando mão desse terceiro título, para que os que aprendem dele saibam que têm um mestre designado por Deus mesmo.

E para quem Paulo diz que fora designado? Para os gentios - pois o cerne da controvérsia eram eles, visto que os judeus negavam que as promessas de vida se aplicassem a alguém mais além dos filhos de Abraão segundo a carne. Portanto, a fim de que a salvação dos gentios não fosse posta em dúvida, o apóstolo declara que fora enviado especificamente por Deus para ministrar a eles.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“PELO APARECIMENTO DE NOSSO SALVADOR CRISTO JESUS”


"PELO APARECIMENTO DE NOSSO SALVADOR CRISTO JESUS"

“E manifestada, agora, pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus, o qual não só destruiu a morte, como trouxe à luz a vida e a imortalidade, mediante o evangelho” (2Tm 1.10).

Devemos notar quão apropriadamente o apóstolo Paulo conecta a fé que recebemos do evangelho com a eleição secreta de Deus e designa a cada uma o seu próprio lugar. Deus nos chamou pela proclamação do evangelho, não porque repentinamente tivesse consciência da nossa salvação, mas porque ele assim o determinou desde toda a eternidade. Cristo agora se manifestou para essa salvação; não porque o poder de salvar lhe tenha sido recentemente conferido, mas porque essa graça nos foi guardada nele antes da criação do mundo. O conhecimento dessas coisas nos foi revelado pela fé. E assim, o apóstolo sabiamente conecta o evangelho com as mais antigas promessas de Deus, para que sua suposta novidade não o expusesse ao desprezo.

Suscita-se, porém, a indagação, se tudo isso foi ocultado dos pais que viveram sob o regime da lei, pois se a graça só foi revelada no advento de Cristo, então conclui-se que antes ela estava oculta. Respondo que Paulo está falando da plena manifestação da realidade propriamente dita, sobre a qual os pais também edificaram sua fé, de modo que isso não os priva da realidade. Eis a razão por que Abel, Noé, Abraão, Moisés, Davi e todos os santos obtiveram a mesma salvação que obtivemos, pois também eles depositaram sua fé na manifestação [futura] de Cristo. Ao dizer que a graça nos foi revelada mediante a manifestação de Cristo, o apóstolo não exclui os pais da participação nela, pois a mesma fé os fez partícipes conosco nessa manifestação. O Cristo de ontem é o mesmo de hoje [Hb 13.8], mas que não se manifestara mediante sua morte e ressurreição antes do tempo prefixado pelo Pai. Nossa fé e a de nossos pais sempre olham para o mesmo ponto, porque neste fato jaz a única garantia e consumação de nossa salvação.

O qual não só destruiu a morte. Pelo fato de atribuir ao evangelho a manifestação da vida, Paulo não quer dizer que ela tenha sua origem na Palavra sem referência alguma à morte e ressurreição de Cristo, posto que o poder da Palavra repousa no assunto que ela contém; ao contrário, ele quer dizer que a única maneira pela qual o fruto dessa graça pode chegar até aos homens é através do evangelho, como expressou em 2Coríntios 5.19: “Deus estava em Cristo reconciliando consigo mesmo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação”. É uma notável e memorável recomendação do evangelho, que seja ele denominado o meio pelo qual a vida se manifesta.

À vida Paulo adiciona imortalidade, querendo dizer: “uma vida genuína e imortal”, a menos que você prefira considerar vida no sentido de regeneração, à qual segue a bem-aventurada imortalidade que é ainda objeto da esperança. Pois nossa vida não consiste do que temos em comum com as bestas brutas, ao contrário, consiste de nossa participação na imagem de Deus. Visto, porém, que a natureza e valor genuínos dessa vida não aparecem neste mundo [1Jo 3.2], para explicá-la ele acrescentou oportunamente a imortalidade, a qual é a revelação dessa vida que ora está oculta.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“QUE NOS SALVOU E NOS CHAMOU COM SANTA VOCAÇÃO”


“QUE NOS SALVOU E NOS CHAMOU COM SANTA VOCAÇÃO”

“Que nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos” (2Tm 1.9).

Pela visão da grandeza da bênção, o apóstolo Paulo demonstra o quanto devemos a Deus, porque a salvação que ele nos outorgou facilmente absorve todos os males que suportamos neste mundo. O termo “salvou”, ainda que seu significado seja de caráter geral, aqui, neste contexto, refere-se somente à salvação eterna. Seu significado consiste em que não haviam recebido através de Cristo nenhum livramento passageiro e transitório, e, sim, uma salvação eterna, e desse modo se revelariam extremamente ingratos, caso valorizassem sua vida fugaz, ou sua reputação, em vez de reconhecê-lo como seu Redentor.

Paulo diz que fomos chamados com “santa vocação”. Ele faz de nossa vocação o selo infalível de nossa salvação. Pois como a salvação foi consumada na morte de Cristo, assim Deus nos faz partícipes dela através de Cristo. Para magnificar essa vocação ainda mais, ele a qualifica de santa. Tal fato deve ser cuidadosamente observado, pois assim como temos de buscar a salvação exclusivamente em Cristo, ele também teria morrido em vão e a troco de nada caso não nos chamasse para participarmos desta graça. Portanto, mesmo depois de haver, com sua morte, nos conquitado a salvação, uma segunda bênção resta ser outorgada, a saber, que ele nos uniria em seu Corpo e nos comunicaria seus benefícios a fim de desfrutarmo-los.

O apóstolo também nos chama a atenção para a fonte, quer de nossa vocação, quer de nossa salvação total. Não possuímos obras que sejam capazes de tomar a iniciativa em lugar de Deus, de modo que a nossa salvação depende absolutamente de seu gracioso propósito e eleição. Ainda que Paulo geralmente use o temo “determinação” no sentido de “o decreto secreto de Deus”, o qual depende exclusivamente dele, o apóstolo, aqui, decide adicionar “graça” com o fim de tornar sua tese ainda mais explícita e poder excluir completamente toda e qualquer referência as obras. A antítese, neste versículo, por si só é suficiente para deixar completamente claro que não há espaço algum para as obras onde reina a graça de Deus, especialmente quando somos lembrados da eleição divina, através da qual ele antecipou eleger-nos antes que viéssemos à existência.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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segunda-feira, 29 de julho de 2024

“NÃO TE ENVERGONHES DO TESTEMUNHO DE NOSSO SENHOR”


“NÃO TE ENVERGONHES DO TESTEMUNHO DE NOSSO SENHOR”

“Não te envergonhes, portanto, do testemunho de nosso Senhor, nem do seu encarcerado, que sou eu; pelo contrário, participa comigo dos sofrimentos, a favor do evangelho, segundo o poder de Deus” (2Tm 1.8).

O apóstolo Paulo diz isso porque, pensava-se que confessar o evangelho era uma grande desventura; por isso ele diz a Timóteo a não permitir que a ambição ou o medo de infâmia obstruísse sua confiante pregação. Declara isso como uma inferência do que esteve justamente afirmando. O homem que se ama com o poder de Deus não se sentirá frustrado pelo tumulto do mundo, mas considerará uma honra que os homens ímpios o cubram de vitupério. O evangelho é aqui denominado com justiça, “o testemunho de nosso Senhor”, pois ainda que ele não necessite de nosso auxílio, não obstante nos impõe o dever de dar testemunho a seu respeito, bem como de sustentar sua glória. Essa é uma grande e especial honra concedida por ele a todos nós, de tal modo que não há cristão que não se considere uma testemunha de Cristo, mas é especialmente concedido aos pastores e mestres, como Cristo mesmo disse a seus apóstolos: “Sereis minhas testemunhas” [At 1.8]. Pois quanto mais o mundo demonstra seu ódio pelo ensino do evangelho, mais coragem devem os pastores demonstrar em seus labores em confessá-lo publicamente.

Ao acrescentar, nem do seu encarcerado, que sou eu”, o apóstolo admoesta Timóteo a não recusar ser seu companheiro numa causa comum. Ao começarmos a nos esquivar da companhia daqueles que estão sofrendo perseguição, nosso intuito é fazer que o evangelho fique isento de toda e qualquer perseguição. Ainda que não faltassem pessoas perversas para dirigir a Timóteo motejos e dizer: “Tu não vês o que tem acontecido a teu mestre? Por que, pois, nos impões uma doutrina que vês ser desdenhada pelo mundo inteiro?” Não obstante, ele deve ter se sentido feliz com essa admoestação. Paulo lhe diz: “Não precisas sentir-se envergonhado a meu respeito, pois de nada tenho que me envergonhar, porque sou o prisioneiro de Cristo; não estou em cadeias por algum crime ou malfeito, e, sim, por seu nome”. Ele diz a Timóteo como fazer o que lhe pede, ou seja, preparando-se para sofrer as aflições que estão relacionadas com o evangelho, pois esquivar-se da cruz ou tentar evitá-la significa sempre envergonhar-se do evangelho. E assim Paulo tem duas razões para encorajar Timóteo a ser ousado em sua confissão, e ao falar sobre levar a cruz, que ele não o fizesse em vão.

E acrescenta “segundo o poder de Deus”, porque imediatamente sucumbimos caso ele não nos sustentasse. A frase contém tanto de admoestação quando de consolação. A admoestação é para volvermos nossos olhos de nossas presentes fraquezas e, confiando no socorro divino, aventurarmo-nos e esforçarmo-nos em relação às coisas que se encontram além de nossas próprias forças; o conforto é para que, caso soframos algo por conta do evangelho, Deus virá e nos livrará e em seu poder nos dará vitória.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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domingo, 28 de julho de 2024

“DEUS NÃO NOS TEM DADO ESPÍRITO DE COVARDIA”


"DEUS NÃO NOS TEM DADO ESPÍRITO DE COVARDIA"

"Porque Deus não nos tem dado espírito de covardia, mas de poder, de amor e de moderação" (2Tm 1.7).

Este versículo confirma a afirmação anterior de Paulo, pela qual ele prossegue insistindo com Timóteo a apresentar evidência do poder dos dons que recebera. Ele apela para o fato de que Deus governa seus ministros pelo espírito de poder que é o oposto do espírito de covardia. Daqui se conclui que eles não devem cair na indolência, mas que devem animar-se com profunda segurança e ardorosa atividade, e que exibam com visíveis resultados o poder do Espírito. Há uma passagem em Romanos 8.15 que, à primeira vista, se assemelha muito a esta; o contexto, porém, revela que o sentido é diferente. Ali, ele está tratando da confiança na adoção possuída por todos os crentes; aqui, porém, sua preocupação é especificamente com os ministros e os exorta na pessoa de Timóteo a animar-se para dinâmicos feitos de bravura, pois o Senhor não quer que exerçam seu ofício pastoral com apatia, senão que avancem com todo vigor, confiando na eficácia do Espírito.

“Mas de poder, de amor e de moderação. Daqui aprendemos que nenhum de nós possui em si mesmo a excelência de espírito e a inabalável confiança necessária no exercício de nosso ministério; devemos ser revestidos com o novo poder do alto. Os obstáculos são tantos e tão imensuráveis, que nenhuma coragem humana é suficiente para transpô-los. Portanto, é Deus quem nos equipa com o Espírito de poder. Pois aqueles que, por outro lado, revelam grande força, caem quando não são sustentados pelo poder do Espírito de Deus.

Em segundo lugar, inferimos que os que são tímidos e servis como escravos, de modo que, quando precisam soerguer-se não ousam tomar qualquer iniciativa em defesa da verdade, esses não são governados pelo Espírito que age sobre os servos de Cristo. Daí se conclui que mui poucos daqueles que se denominam ministros de Cristo, hoje, dão mostras de ser genuínos. Pois dificilmente se encontrará entre eles um que, confiando no poder do Espírito, destemidamente desdenhe de toda altivez que se exalta contra Cristo! Acaso a grande maioria não se preocupa mais com seu próprio interesse? Não se prostram mudos assim que estala algum problema? Como resultado, em seu ministério não resplandece nada da majestade de Deus.

Mas, por que depois de poder ele acrescenta amor e moderação? Em minha opinião, é para distinguir o poder do Espírito do excessivo zelo dos fanáticos que se precipitam numa desenfreada pressa e se gabam de possuir o Espírito de Deus. Portanto, o apóstolo Paulo explicitamente declara que a poderosa energia do Espírito é temperada pelo amor e sobriedade, ou seja, por uma serena solicitude pela edificação. Paulo não está negando que o mesmo Espírito fosse comunicado aos profetas e mestres antes da publicação do evangelho, mas insinua que essas duas graças seriam especialmente evidentes e poderosas sob o reino de Cristo.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“QUE REAVIVES O DOM DE DEUS QUE HÁ EM TI”


QUE REAVIVES O DOM DE DEUS QUE HÁ EM TI

“Pela recordação que guardo de tua fé sem fingimento, a mesma que, primeiramente, habitou em tua avó Lóide e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também, em ti. Por esta razão, pois, te admoesto que reavives o dom de Deus que há em ti pela imposição das minhas mãos” (2Tm 1.5,6).

O apóstolo Paulo enaltece a fé tanto de Timóteo quanto de sua vó e sua mãe, mais para encorajá-lo do que para elogiá-lo. Pois quando alguém sente que fez bom e corajoso começo, seu progresso deve injetar-lhe ânimo para avançar mais, e os exemplos de seu próprio círculo familiar são o mais forte incentivo a impulsioná-lo para frente. Essa é a razão por que ele pôs sua avó, Lóide, e sua mãe, Eunice, por cuja instrumentalidade fora educado em sua infância, de uma forma tal que ele pôde nutrir-se da piedade.

“Por esta razão, pois, te admoesto que reavives o dom de Deus”. O que Paulo quer dizer é que, quanto mais abundante for a participação que Timóteo tiver na graça que recebera, mais intenso deve ser o seu desejo de progredir diariamente. É preciso que atentemos bem como as palavras, por esta razão, conectam esta passagem com o que vem antes. Porque esta exortação é sumamente necessária, pois sucede com frequência, e deveras é muito natural, que a excelência dos dons produz descuido e frouxidão, sendo essa a maneira na qual Satanás age continuamente a fim de extinguir em nós tudo quando provém de Deus.

“Que há em ti pela imposição das minhas mãos”. Não há dúvida que Timóteo fora solicitado a ser ministro pelo sufrágio comum da Igreja, e que não fora escolhido pela seleção pessoal da iniciativa de Paulo, mas é mui compreensível que Paulo atribua a eleição a ele pessoalmente, visto ter sido seu principal incentivador. Mas aqui ele está tratando de sua ordenação, e não de sua eleição, ou seja, do solene ato de instituição ao ofício de pastor: “Não negligencies o dom que há em ti, o qual te foi concedido mediante profecia, com a imposição das mãos do presbitério [1Tm 4.14].

A imposição de mãos era um fiel emblema da graça que eles recebiam da própria mão de Deus. Essa cerimônia não era um ato profano, engendrado só com o intuito de obter autoridade aos olhos dos homens, mas era um legítimo ato de consagração diante de Deus, algo que só poderia ser efetuado pelo poder do Espírito Santo. É verdade que Timóteo se distinguia tanto em doutrina quanto em outros dons antes que Paulo o designasse para o ministério. Mas não há incongruência alguma em ele sustentar que quando Deus propôs usar Timóteo em sua obra, e convocá-lo para a sua realização, ele então o capacitou e o enriqueceu ainda mais com novos dons, ou conferiu-lhes uma dupla porção daqueles que já havia recebido. Portanto, não significa que Timóteo não possuísse nenhum dom antes de sua ordenação, senão que esses dons se manifestaram mais gloriosamente quando a função docente lhe foi conferida.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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sexta-feira, 26 de julho de 2024

“TORNAM-SE-LHE MANIFESTOS OS SEGREDOS DO CORAÇÃO”


“TORNAM-SE-LHE MANIFESTOS OS SEGREDOS DO CORAÇÃO”

“Tornam-se-lhe manifestos os segredos do coração, e, assim, prostrando-se com a face em terra, adorará a Deus, testemunhando que Deus está, de fato, no meio de vós” (1Co 14.25).

Quando o apóstolo Paulo diz no versículo 24 que o incrédulo é por todos convencido e por todos julgado, devemos entendê-lo como a falar por todos os que profetizam, pois havia dito no início do versículo: “se todos profetizarem”. Ele fez uso proposital do termo “todos” a fim de demovê-los de seu menosprezo em relação à profecia. O incrédulo é convencido, afirmo, não porque a profecia pronuncia juízo sobre ele, seja em sua opinião secreta, não expressa, ou no que ele realmente diz em termos explícitos, mas porque, ao ouvir sua consciência aceita seu próprio julgamento através do que é ensinado. Ele é julgado porque desce às profundezas do seu próprio ser e, após examinar-se, chega a uma avaliação do que ele realmente é, este conhecimento que lhe fora negado antes. Há uma palavra de Cristo que constitui a mesma ideia: “Quando ele [o Espírito Santo] vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo” (Jo.16.8). Logo a seguir Paulo adiciona: “Os segredos de seu coração se farão manifestos”. Pois, em minha opinião, Paulo não quer dizer que não é evidente a alguém que tipo de pessoa ele é, senão que sua consciência é despertada para que ele conheça seus pecados, os quais lhe estiveram ocultos até então.

Pois é o conhecimento de Deus, e nada mais, o que pode reduzir o orgulho da carne. A profecia leva isso a suceder-nos. Por sua própria natureza, ela é peculiarmente eficaz para derribar os homens de seus pináculos e fazê-los prostrar-se em adoração diante de Deus. Todavia, mesmo a profecia é de nenhum valor para muitos; na verdade, ao ouvi-la, se tornam piores ainda. Demais, ao atribuir este poder à profecia, Paulo não pretendia inferir que ela é invariavelmente operante. Queria simplesmente realçar que dela advém grande benefício e qual a natureza de sua função. Portanto, deixa-se entrever que ela força os incrédulos a confessar que Deus está presente com o seu povo, e sua majestade é refletida em sua reunião.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“SE TODOS PROFETIZAREM, E ENTRAR ALGUM INCRÉDULO”


“SE TODOS PROFETIZAREM, E ENTRAR ALGUM INCRÉDULO”

“Porém, se todos profetizarem, e entrar algum incrédulo ou indouto, é ele por todos convencido e por todos julgado” (1Co 14.24).

Assim como previamente mostrara como a profecia é mais benéfica do que as línguas aos que são da família da fé, agora o apóstolo Paulo ensina que ela é também de grande valor para os de fora. Este é o argumento mais poderoso para provar que os coríntios trilhavam a vereda do erro. Pois era extremamente perverso de sua parte dar pouca importância a um dom que gera imenso benefício aos que vivem fora da igreja, tanto quanto aos que vivem dentro de seus muros. Ele realça o efeito que a profecia produz, a saber: ela intima as consciências dos incrédulos a comparecerem perante o tribunal divino, e as satura de uma mui vívida realização do juízo divino, de modo que qualquer um que em sua indiferença costuma menosprezar a sã doutrina é constrangido a glorificar a Deus.

Acharemos, porém, muito mais fácil entender este versículo se compararmos com outro, a saber, Hebreus 4.12: “Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até o ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração”. Pois em ambos os textos se diz que a Palavra de Deus possui o mesmo tipo de eficácia, porém, em Hebreus, a descrição é muito mais completa e clara. No tocante ao versículo que se acha diante de nós, agora não resta qualquer dificuldade em entendermos o que significa ser convencido e ser julgado. As consciências dos homens se acham adormecidas e inativas, bem como insensíveis ao senso de descontentamento com seus pecados, visto que se desenvolveram nas trevas da ignorância. Em resumo, a descrença é como sonolência que faz alguém impassível. Mas a Palavra de Deus penetra até aos recantos mais íntimos da mente, e, ao trazer a luz, por assim dizer, dissipa as trevas e expulsa a letargia letal. Portanto, esta é a forma em que os incrédulos são convencidos, porque, assim que compreendem que é com Deus que terão de tratar, ficam seriamente perturbados e deveras assustados e temerosos. É assim que também são julgados, porque, enquanto viviam envoltos por trevas, quando não faziam a menor ideia do estado miserável e vergonhoso de suas vidas, agora são trazidos à luz e dão testemunho contra si mesmos.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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quinta-feira, 25 de julho de 2024

“NAS TUAS MÃOS, ENTREGO O MEU ESPÍRITO”


“NAS TUAS MÃOS, ENTREGO O MEU ESPÍRITO”

“Nas tuas mãos, entrego o meu espírito; tu me remiste, SENHOR, Deus da verdade" (Sl 31.5).

O salmista Davi uma vez mais declara sua fé em Deus e afirma que nutria pensamentos tão elevados acerca da providência divina, que depositava sobre ela todas as suas preocupações. Todos quantos se põem nas mãos de Deus e se confiam à sua proteção, não só o constitui o árbitro da vida e da morte, mas também serenamente passam a depender dele para sua proteção em meio a todos os perigos que porventura enfrentem. É preciso observar que não é possível que alguém encomende sua vida a Deus com sinceridade, senão aquele que se considera exposto a milhares de mortes e cuja vida pende por um fio. Achando-se Davi assim ao ponto de desespero, nada tem a fazer senão isto: seguir seu caminho, confiando em Deus como o guardador e governador de sua vida. É espantoso que, embora muitas coisas aflijam a todos nós, dificilmente encontramos um em cem que seja tão sábio ao ponto de encomendar sua vida às mãos divinas. Multidões vivem dia a dia tão eufórica e displicentemente como se estivessem deitadas em quietas redes, isentas de toda perturbação; tão logo, porém, encontrem algo que as terrifique, se sentem como se a angústia as destruísse. Assim sucede que nunca se rendem a Deus, seja porque se iludem com vãs ilusões, gabando-se de que tudo lhes irá bem, ou porque se sentem tão estremecidos de medo, tão petrificados com espanto que não nutrem qualquer alento de entregar-se ao seu cuidado paterno. Além do mais, quando as várias tempestades de tristeza nos perturbam, ou nos desviam da reta vereda do dever, ou no mínimo nos arrancam de nosso posto, o único antídoto que existe para acalmar tais coisas é considerar que Deus é o Autor e preservador de nossas vidas. Este, pois, é o único meio de aliviar todas as nossas cargas e impedir-nos de sermos tragados por tantas preocupações. Visto, pois, que Deus se condescende em tomar cuidado de nossa vida e de suportá-la, embora seja ela repetidas vezes exposta a diversas sortes de morte, aprendamos sempre a buscar refugio em seu abrigo; não só isso, mas quanto mais alguém se vê exposto aos perigos, mais se exercita a meditar criteriosamente em seu zelo por nós. Em suma, que seja este nosso escudo contra todos os perigosos ataques - nosso céu em meio a todas as agitações e tempestades -, a saber, embora nossa segurança esteja além de toda e qualquer esperança humana, Deus é o fiel guardião dela; e que isso também nos desperte à oração, para que ele nos defenda e garanta nosso livramento.

Concluindo, quem quer que não confie na providência divina, bem como não encomende sua vida à fiel diretriz dela, ainda não aprendeu corretamente o que significa viver. Em contrapartida, aquele que confiar a guarda de sua vida ao cuidado divino, não duvidará de sua segurança mesmo em face da morte. Devemos, pois, depositar nossa vida nas mãos de Deus, não só para que ele a conserve em segurança neste mundo, mas também para que a preserve da destruição da própria morte, como o próprio exemplo de Cristo nos tem ensinado. Da forma como Davi desejava ter sua vida prolongada em meio aos perigos mortais, assim Cristo enfrentou esta vida transitória para que sua alma fosse salvaguardada na morte. Portanto, esta é uma oração geral, na qual os fiéis encomendam suas vidas a Deus, para que ele os proteja pela instrumentalidade de seu poder, sempre que se veem expostos aos perigos deste mundo. Devemos igualmente assegurar-nos de que não somos esquecidos de Deus, quer na vida quer na morte; porquanto os que Deus protege com seu poder até o término de sua jornada, por fim os recebe em seu seio quando morrem. Esta é uma das principais passagens da Escritura à luz da qual podemos com mais eficácia corrigir nossa incerteza. Ela nos ensina, em primeiro lugar, que os fiéis não devem atormentar-se acima da medida com infelizes preocupações e ansiedades; e, em segundo lugar, não devem viver tão dominados pelos temores ao ponto de cessarem de realizar seus deveres; nem definhar e desfalecer de tal maneira ao ponto de se valerem de vãs esperanças e de enganosos auxílios; nem dar vazão aos temores e aos estresses; e, por fim, que não temam a morte, a qual, ainda que destrua o corpo, não pode extinguir a alma. Este deveras deve ser nosso principal argumento a fim de subjugar todas as tentações, a saber, que Cristo, ao encomendar sua alma a seu Pai, garantiu a proteção das almas de todo o seu povo. Estêvão, pois, o invoca para que fosse seu guardador, dizendo: “Senhor Jesus, recebe meu espírito” [At 7.59]. Uma vez que a alma é a sede da vida, ela, neste respeito, como se sabe muito bem, é usada para significar a vida.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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terça-feira, 23 de julho de 2024

“QUEM ÉS TU, Ó HOMEM, PARA DISCUTIRES COM DEUS?!


“QUEM ÉS TU, Ó HOMEM, PARA DISCUTIRES COM DEUS?!

“Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim? Ou não tem o oleiro direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro, para desonra?” (Rm 9.20,21).

Como vemos, o apóstolo Paulo continua insistindo sobre a necessidade de considerarmos justa a vontade Deus, embora possa ser que a razão para isto nos esteja oculta. Ele mostra que Deus é usurpado de seu direito, caso não seja livre para tratar com suas criaturas segundo seu modo justo de proceder. Isto parece desagradável a muitos. Outros alegam ainda que Deus seria muitíssimo desonrado caso um poder tão arbitrário lhe seja atribuído. Mas seu escrúpulo faz deles melhores teólogos que Paulo, o qual estabeleceu como regra a humildade para os crentes, que devessem erguer os olhos para a soberania divina, e que não seja ela medida pelos seus tacanhos critérios.

Paulo reprime a tendenciosa arrogância de se contender com Deus, fazendo uso de uma metáfora mui apropriada, na qual sua alusão parece ser a Isaías 45.9, e não a Jeremias 18.6. A verdade que aprendemos de Jeremias é aquela em que Israel se acha na mão do Senhor, de modo que, por causa de seus pecados, Deus pode quebrá-lo em muitos pedaços, como faz um oleiro a seu vaso de barro. Mas Isaías avança mais. Diz ele: “Ai daquele que contende com o seu Criador! E não passa de um caco de barro entre outros cacos. Acaso dirá o barro aos que lhe dá forma: Que fazes?” Não há, seguramente, nenhuma razão plausível para um mortal imaginar-se superior a um vaso de barro, quando é ele confrontado com Deus.

Esta é a razão por que a coisa formada jamais deve discutir com aquele que a formou, porque este tem direito de fazê-la como queira. O termo direito não significa que o modelador tenha o direito ou o poder de fazer o que lhe agrada, mas que o poder de agir com retidão lhe pertence. Paulo não pretende reivindicar para Deus um poder desordenado, senão que lhe atribui o poder de agir com perfeita equidade.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“OS OLHOS DO SENHOR ESTÃO SOBRE OS QUE O TEMEM”


OS OLHOS DO SENHOR ESTÃO SOBRE OS QUE O TEMEM

Eis que os olhos do SENHOR estão sobre os que o temem, sobre aqueles que esperam em sua misericórdia, para livrar suas almas da morte e para conservar-lhes a vida no tempo da fome” (Sl 33.18,19).

Havendo demonstrado que, o que os homens consideram sua melhor defesa amiúde não lhes traz nenhum proveito, ou, melhor, é totalmente sem efeito quando dependem de tais coisas, o salmista agora mostra, em contrapartida, que os crentes, embora não sejam revestidos de grande poder nem possuam grande riqueza, não obstante são única e suficientemente protegidos pelo favor divino e se sentirão seguros para sempre. Sua intenção é bem ilustrada com esta comparação, a saber, que os reis e gigantes não recebem nenhum auxílio de sua força embora pareça invencível, enquanto que Deus sustenta a vida dos santos na fome e na morte. Consequentemente entendemos melhor por que o profeta põe abaixo toda a força do mundo; seguramente não para que os homens fiquem prostrados ou se veem tão quebrantados que se entreguem ao desespero, mas porque, desfazendo-se de seu orgulho, firmem bem seus pensamentos em Deus somente e se persuadam de que sua vida depende tão-só da proteção divina. Além do mais, ao dizer que os olhos de Deus estão postos sobre os que o temem e os salva, ele expressa mais do que se houvera dito que sua mão e poder foram suficientes para preservá-los. E possível que uma dúvida entre sorrateiramente nas mentes dos fracos, a saber, se Deus estende esta proteção a todo e qualquer indivíduo. Quando, porém, o salmista o introduz como que mantendo vigilância e custódia, por assim dizer, sobre a segurança dos fiéis, não há razão por que algum deles deva tremer ou hesitar em seu íntimo por um longo período, uma vez ser indubitável que Deus está presente com ele e o assiste, desde que o mesmo permaneça tranquilo sujeito à providência divina. À luz deste fato, também surge ainda mais claramente quão veraz era o que o salmista acabava de dizer: quão bem-aventurado é o povo cujo Deus é SENHOR, porque sem ele toda a força e riquezas que porventura possuamos serão ilusórias e perecíveis; enquanto, com um único olhar, ele defende seu povo, supre suas necessidades, o alimenta no tempo de fome e o preserva vivo quando se acha destinado à morte. Toda a raça humana, sem dúvida, é sustentada pela providência divina; mas sabemos que seu cuidado paternal especialmente se destina não a qualquer um, senão a seus próprios filhos, os quais têm consciência de que suas necessidades são por ele realmente levadas em conta.

Além disso, quando se afirma que Deus, em tempos de fome e de morte, tem disponível um antídoto para preservar a vida dos piedosos, somos instruídos que só os fiéis prestam a devida honra à providência divina quando não permitem que seus corações percam o alento e cheguem a mais extrema indigência; mas, ao contrário, que despertem suas esperanças mesmo nos recessos do túmulo. Deus às vezes permite que seus servos sofram fome por algum tempo, para que depois os sacie, e que os envolve com as trevas da morte, para que a seguir os restaure à luz da vida. Sim, só começamos a pôr nossa firme confiança nele quando a morte surge diante de nossos olhos; porque, até que conheçamos, por experiência, a vacuidade dos auxílios do mundo, nossos afetos continuarão enredados por eles e a eles atados. O salmista caracteriza os crentes por duas marcas, as quais compreendem toda a perfeição de nossa vida. A primeira consiste em que reverentemente sirvamos ao Senhor; e a segunda, que dependamos de sua graça. Quando os fiéis se entregam, de todo o coração, ao serviço e temor de Deus, este afeto emana da fé; ou, melhor, a parte principal do verdadeiro culto que os fiéis rendem a Deus consiste nisto: que dependam da misericórdia divina.

Deus nos abençoe!

João Calvino (1509-1564).

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“NOSSO AUXÍLIO E ESCUDO”


“NOSSO AUXÍLIO E ESCUDO”

“Nossa alma espera no SENHOR, nosso auxílio e escudo” (Sl 33.20).

O que o salmista até aqui falou concernente à providência de Deus, e particularmente sobre a fiel tutela com que ele protege seu povo, agora ele fala não tanto de si próprio, mas como porta-voz do Espírito Santo. Portanto, em nome de toda a Igreja, ele entoa seu cântico declarando que não existe nada melhor que confiar nosso bem-estar a Deus. E assim vemos que o fruto da doutrina precedente é manifesto a todos os verdadeiros crentes, para que, sem qualquer hesitação, se lancem com seu coração confiante e alegre sobre o paternal cuidado de Deus. Desta forma, o salmista não declara nada acerca de si próprio em particular, mas une a si todos os piedosos no reconhecimento da mesma fé. Há certa ênfase intencional na palavra alma; pois, embora seja este o modo comum de se expressar entre os hebreus, contudo ele expressa um afeto solícito; como se os crentes dissessem: Sinceramente confiamos em Deus de todo nosso coração, reputando-o como nosso auxílio e escudo.

Deus nos abençoe

João Calvino (1509-1564).

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segunda-feira, 15 de julho de 2024

“QUANDO, PORÉM, VIER O CONSOLADOR”


“QUANDO, PORÉM, VIER O CONSOLADOR”

“Quando, porém, vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade, que dele procede, esse dará testemunho de mim” (Jo 15.26).

Devemos observar neste versículo o que nosso Senhor fala a respeito do Espírito Santo. Ele se referiu ao Espírito como uma pessoa, chamando-O de “o Consolador e o Espírito da verdade”. Jesus afirmou que o Espírito Santo seria por Ele enviado e procederia do Pai. Seu ofício seria dar testemunho e nos guiar a toda a verdade: “Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo: do pecado, porque não creem em mim; da justiça, porque vou para o Pai, e não me vereis mais; do juízo, porque o príncipe deste mundo já está julgado. Tenho ainda muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora; quando vier, porém, o Espírito da verdade, ele vos guiará a toda a verdade” (Jo 16.8-13).

O fato de que várias denominações evangélicas no mundo estão divididas por causa do significado das palavras de Jesus deve nos ensinar que precisamos abordá-las com humildade e reverência. Acima de tudo, uma verdade permanece evidente: existe um íntimo relacionamento entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Não podemos explicar porque o Espírito Santo seria enviado pelo Filho e procederia do Pai. Mas podemos sossegar nossas mentes com o pensamento expresso em um credo antigo: “Na Trindade, nenhuma das Pessoas está à frente ou atrás da Outra; Nenhuma é maior ou menor que a Outra”. E, além disso, podemos descansar na certeza de que, na salvação de nossas almas, todas as pessoas da Trindade cooperam igualmente. O Deus que nos criou é o mesmo que nos salvou!

Tenhamos sempre o cuidado em apresentar a doutrina sobre o Espírito Santo. Estejamos certos de que sustentamos pontos de vista corretos e bíblicos a respeito de Sua natureza, pessoa e obra. Religiosidade que não tem lugar para o Espírito Santo e rejeita sua atividade é muito comum em nossos dias. Fiquemos atentos para que este não seja o nosso caso. “O que representa para nós o Cordeiro de Deus?” Qual a importância do Espírito Santo nisto? Cuidemos para que a obra do Espírito Santo não se encontre de tal maneira sepultada em opiniões extravagantes sobre a igreja, sobre o ministério cristão e sobre as ordenanças, que o verdadeiro Espírito Santo das Escrituras esteja ausente em nossas vidas. “E, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele” (Rm 8.9).

Deus nos abençoe!

J.C.Ryle (1816-1900).

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quinta-feira, 11 de julho de 2024

“A NATUREZA DA VERDADEIRA LIBERDADE”


“A NATUREZA DA VERDADEIRA LIBERDADE”

“Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres” (Jo 8.36).

Nosso Senhor Jesus declarou aos judeus: “Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres”. A liberdade, nós sabemos, é reputada como uma das mais sublimes bênçãos temporais. Ser liberto da dominação estrangeira, comércio e imprensa livre, liberdade civil e religiosa - quantos significados encontram-se nessas expressões! A fim de manter os conceitos representados por elas, muitas pessoas já sacrificaram suas vidas e bens. Contudo, apesar de toda a nossa vanglória, os supostos homens livres não passam de escravos. Existem muitos que ignoram completamente a mais sublime e pura forma de liberdade. Essa liberdade é uma propriedade do verdadeiro cristão. As pessoas perfeitamente livres são apenas aqueles que o “Filho” liberta. Todas as demais, cedo ou tarde, descobrirão que são escravas.

Em que consiste a liberdade dos verdadeiros cristãos? Eles se tornam livres da culpa e das consequências do pecado, por intermédio do sangue de Cristo. Sendo justificados, perdoados e purificados, podem olhar com ousadia para o Dia do Julgamento e afirmar: “Quem intentará acusação contra nós? Quem nos condenará?” Pelo Espírito de Cristo, eles são libertos do poder do pecado, que não tem mais domínio sobre eles. Visto que foram regenerados, convertidos e santificados, eles mortificam e vencem o pecado, não sendo mais levados cativos por ele. Esta liberdade pertence a todos os verdadeiros cristãos desde o momento em que vieram a Cristo e entregaram-Lhe suas almas. Naquela ocasião, tornaram-se livres e possuem esta liberdade para sempre. A morte não os destruirá. Mesmo o sepulcro não poderá reter seus corpos por muito tempo. Aqueles que Cristo libertou estão libertos para toda a eternidade.

Jamais descansemos até que, por experiência própria, tenhamos esta liberdade, Sem ela, qualquer outra liberdade é apenas um privilégio inútil. Liberdade política, comercial, nacional - todas elas não podem confortar alguém em seus últimos dias, ou mesmo anular o aguilhão da morte, ou conceder paz à nossa consciência. Somente a liberdade que Cristo outorga pode fazer isto. Ele a oferece gratuitamente a todos aqueles que a buscarem com humildade. Por conseguinte, não descansemos até que ela nos pertença.

Deus nos abençoe!

J.C.Ryle (1816-1900).

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“A NATUREZA DA VERDADEIRA ESCRAVIDÃO”


“A NATUREZA DA VERDADEIRA ESCRAVIDÃO”

“E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (Jo 8.32).

Os judeus amavam vangloriar-se, embora não tivessem fundamento correto, de que eram politicamente livres e de que eram escravos de qualquer poder estrangeiro. Nosso Senhor Jesus recordou-lhes que havia outra escravidão à qual eles não davam a mínima atenção, ainda que estivessem subjugados por ela.

Quantas pessoas, em todo o mundo, são escravas do pecado, embora não o admitam! Tornaram-se cativos de suas habituais fraquezas e corrupções e mostram-se incapazes de serem libertos. Ambição, amor ao dinheiro, jogos de azar, relações ilícitas - todas estas coisas dominam os homens. Todas elas possuem multidões de infelizes prisioneiros, acorrentados pelas mãos e os pés. Os miseráveis prisioneiros não admitem sua escravidão. Às vezes, orgulham-se de serem eminentemente livres. No entanto, há ocasiões em que o fogo da aflição penetra-lhes a alma e percebem amargamente que, de fato, são escravos.

Não existe escravidão semelhante a esta. O pecado realmente é o mais severo de todos os senhores. Miséria e infelicidade nesta vida; desespero e inferno no porvir - estes são os únicos salários que o pecado paga aos seus súditos. Libertar o homem desta escravidão é o grande objetivo do evangelho. Despertar as pessoas a fim de que percebam sua degradação, mostrar-lhes as correntes em que estão presas, fazer que acordem e lutem por serem livres - este é o grande alvo por que Cristo enviou seus ministros. Feliz é a pessoa que teve seus olhos abertos e descobriu o perigo. Saber que estamos cativos é o primeiro passo em direção a liberdade.

Deus nos abençoe!

J.C.Ryle (1816-1900).

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