“DEUS É NOSSA ESPERANÇA”
“Esperai nele
em todo tempo; derramai, ó povo, vosso coração diante dele; Deus é nossa
esperança.” (Sl 62.8).
A expressão, em
todo tempo, significa tanto prosperidade quanto adversidade,
notificando a culpabilidade daqueles que vacilavam e sucumbiam sob a própria
variação em suas circunstâncias externas. Deus prova seus filhos com aflições;
aqui, porém, são ensinados por Davi a resisti-las com perseverança e coragem. Os hipócritas, que são
espalhafatosos em seus louvores a Deus enquanto a prosperidade brilha sobre
suas cabeças, ainda que seus corações desmaiem ante a primeira aparição de
provas, desonram seu nome pondo injuriosa limitação a seu poder. Somos obrigados a dar honra a seu nome, lembrando, em nossas mais
extremas aflições, que a ele pertencem as consequências da morte. E visto que
todos nós somos por demais dispostos, em tais ocasiões, a ordenar silêncio às
nossas aflições em nosso próprio peito - circunstância esta que só pode agravar
ainda mais a angústia e amargura mental contra Deus -, Davi não poderia sugerir
melhor expediente do que o de depor diante dele nossas preocupações, e
assim derramar nossos corações diante dele. É sempre experimentado que,
enquanto o coração sentir-se premido pelo fardo da angústia, não haverá
liberdade na oração. Sob as circunstâncias penosas, devemos buscar conforto na
ponderação de que Deus nos proverá lenitivo, contanto que espontaneamente deponhamos
tudo diante dele. A advertência do salmista é em extremo necessária,
considerando a prejudicial tendência que inerentemente nutrimos em manter
nossas dificuldades encerradas em nosso íntimo até que nos levem ao desespero. Comumente,
o fato é que os homens se mostram ansiosos e engenhosos em buscar a via de
escape para os problemas quando estes passam a pressioná-los; mas enquanto
evitarem chegar à presença de Deus, outra coisa não farão senão envolver-se
cada vez mais num labirinto de dificuldades. Para não insistir mais sobre
palavras, Davi precisa ser aqui entendido como a expor esse princípio mórbido,
porém profundamente arraigado em nossa natureza, o qual nos leva a ocultar e a
ruminar nossas tristezas, em vez de aliviarmo-nos de vez derramando nossas
queixosas orações diante de Deus. A consequência é que somos perturbados mais e
mais com nossos infortúnios e nos imergimos num estado de angustiante
desesperança. No término do versículo, Davi diz, em referência ao povo em
geral, o que havia dito de si mesmo como indivíduo, que sua segurança só
poderia ser encontrada na divina proteção.
Deus nos abençoe!
João Calvino (1509-1564).
Nenhum comentário:
Postar um comentário