"SER CRISTÃO É TER MENTE E CORAÇÃO DE CRISTO".



terça-feira, 15 de abril de 2025

“A PALAVRA DE SALVAÇÃO” - Introdução


“A PALAVRA DE SALVAÇÃO” - Introdução

“E disse a Jesus: Senhor, lembra-te de mim quando entrares no teu reino. E disse-lhe Jesus: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23.42,43).

A segunda declaração de Cristo na cruz foi feita em resposta ao pedido do ladrão à beira da morte. Antes de considerarmos as palavras do Salvador ponderaremos primeiro sobre o que as ocasionou. Não foi acidente algum o fato de o Senhor da glória ter sido crucificado entre dois ladrões. Nada ocorre por acidente em um mundo que é governado por Deus. Muito menos poderia ter havido qualquer acidente naquele dia dos dias, ou em conexão com aquele evento dos eventos — um dia e um evento que estão situados no próprio centro da história do mundo. Não, Deus estava presidindo sobre aquela cena. Desde a eternidade toda ele havia decretado quando e onde e como e com quem seu Filho deveria morrer. Nada foi deixado ao acaso ou ao capricho do homem. Tudo que Deus tinha decretado veio a suceder exatamente como ele havia ordenado, e nada aconteceu que não tivesse ele eternamente intentado. Tudo quanto o homem fez foi simplesmente o que a mão e o conselho divinos “tinham anteriormente determinado” (At 4.28).

Quando Pilatos deu ordens para que o Senhor Jesus fosse crucificado entre os dois malfeitores, estava pondo em execução o decreto eterno de Deus e cumprindo sua palavra profética, coisas que lhe eram totalmente desconhecidas. Setecentos anos antes que esse dignitário romano desse sua ordem, Deus tinha declarado mediante Isaías que seu Filho deveria ser “contado com os transgressores” (Is 53.12). Quão totalmente improvável parecia isso, que o Santo de Deus devesse ser contado com os ímpios; que aquele mesmo cujo dedo havia inscrito nas tábuas de pedra da Lei do Sinai devesse ter um lugar designado entre os sem lei; que o Filho de Deus devesse ser executado com os criminosos — tal parecia completamente inconcebível. Todavia, na realidade, foi o que veio a ocorrer. Nem uma só palavra divina pode-se deixar escapar. “Para sempre, ó Senhor, a tua palavra permanece no céu” (Sl 119.89). Assim como Deus havia ordenado, e assim como havia anunciado, assim aconteceu.

Porque ele ordenou que seu Filho devesse ser crucificado entre dois criminosos? Certamente que Deus tinha uma razão para tal; uma boa, uma múltipla razão, quer possamos discerni-la ou não. Ele nunca procede arbitrariamente. Ele tem um bom propósito para tudo o que faz, pois todas as suas obras estão ordenadas pela sabedoria infinita. Nesse exemplo particular, várias respostas se insinuam à nossa inquirição. Não foi nosso bendito Senhor crucificado com os dois ladrões para demonstrar plenamente as insondáveis profundezas da vergonha em que havia descido? Em seu nascimento ele estava rodeado pelas bestas do campo e, agora, em sua morte, é contado com a escória da humanidade.

Outra vez, não foi o Salvador contado com os transgressores para nos mostrar a posição que ele ocupou como nosso substituto? Ele havia ocupado o lugar que era nosso, e o que era senão o lugar de vergonha, o lugar dos transgressores, o lugar dos criminosos condenados à morte!

Outra vez, não foi ele deliberadamente humilhado daquele modo por Pilatos para mostrar a avaliação pelo homem daquele inigualável — “desprezado” tanto quanto rejeitado!

Outra vez, não foi ele crucificado com os dois ladrões, de modo que naquelas três cruzes e nos que nelas estavam dependurados, pudéssemos ter a representação vívida e concreta do drama da salvação e da resposta do homem a isso — a redenção do Salvador; o pecador que se arrepende e crê; e o que insulta e rejeita?

Uma outra importante lição que podemos aprender da crucificação de Cristo entre os dois ladrões, e o fato de que um o recebeu e o outro o rejeitou, é a da soberania divina. Os dois malfeitores foram crucificados juntos. Estavam à mesma proximidade de Cristo. Ambos viram e ouviram tudo o que se tornou conhecido durante aquelas seis fatídicas horas. Ambos eram notoriamente perversos; ambos estavam sofrendo agudamente; ambos estavam morrendo, e ambos necessitavam urgentemente de perdão. Todavia, um morreu em seus pecados, morreu como tinha vivido — endurecido e impenitente; ao passo que o outro se arrependeu de sua maldade, creu em Cristo, recorreu a ele para obter misericórdia e entrou no Paraíso. Como explicar isso, senão pela soberania de Deus!

Vemos precisamente que a mesma coisa continua hoje. Sob exatamente as mesmas circunstâncias e condições, um é enternecido e outro permanece inalterado. Sob o mesmo sermão, um homem ouvirá com indiferença, enquanto outro terá seus olhos abertos para ver sua necessidade e sua vontade movida para perto da oferta da misericórdia divina. Para um, o evangelho é revelado, para outro, “oculto”. Por quê? Tudo o que podemos dizer é: “Sim, ó Pai, porque assim te aprouve”. E, contudo, a soberania divina nunca quer dizer destruir a responsabilidade humana. Ambas são claramente ensinadas na Bíblia, e é nosso dever crer e pregar as duas, quer possamos harmonizá-las ou compreendê-las quer não. Ao pregarmos ambas pode parecer a nossos ouvintes que nos contradizemos, mas que importa?

Disse o falecido C. H. Spurgeon, quando pregava em 1Timóteo 2.3,4: “Ali no texto se acha, e creio que é do desejo de meu Pai, que ‘todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade’. Mas eu sei, também, que ele não o quer, de modo que salvará a qualquer um daqueles, apenas se crerem em seu Filho; pois ele no-lo disse repetidas vezes. Ele não salvará homem algum, a menos que esse abandone seus pecados, e se volte para ele com pleno propósito de coração: isso eu também sei. E sei, ainda, que ele tem um povo a quem salvará, a quem, por seu eterno amor, elegeu e a quem, por seu eterno poder, ele libertará. Eu não sei como aquilo se ajusta com isso, que é mais uma das coisas que não sei.” E disse esse príncipe dos pregadores: “Eu permanecerei exatamente no que sempre hei de pregar e sempre tenho pregado, e tomo a palavra de Deus como está, possa eu reconciliá-la com uma outra parte da palavra divina ou não.” Dizemos novamente, a soberania de Deus nunca significa destruir a responsabilidade do homem. Devemos fazer uso diligente de todos os meios que ele designou para a salvação das almas. Somos ordenados a pregar o evangelho a “toda criatura”. A graça é livre: o convite é amplo o bastante para “quem crer” o aceitar. Cristo não despede ninguém que venha a ele. Todavia, após havermos feito tudo, após havermos plantado e aguado, é Deus quem dá o crescimento, e o faz de modo a melhor satisfazer sua soberana vontade.

Na salvação do ladrão agonizante temos uma visão clara da graça vitoriosa, como não encontrada em nenhum outro lugar na Bíblia. Deus é o Deus de toda graça, e a salvação é inteiramente por meio dessa. “Pela graça sois salvos” (Ef 2.8), e é “pela graça” do começo ao fim. A graça planejou a salvação, a graça proveu a salvação, e a graça assim opera sobre e em seus eleitos para sobrepujar a dureza de seus corações, a obstinação de suas vontades, e a inimizade de suas mentes, e assim os torna propensos a receber a salvação. A graça inicia, a graça continua, e a graça consuma a nossa salvação.

A salvação pela graça — soberana, irresistível, livre graça — é ilustrada no Novo Testamento tanto por exemplo quanto por preceito. Talvez os dois casos mais contundentes de todos sejam os de Saulo de Tarso e do Ladrão Agonizante. E esse último é até mais digno de nota que o primeiro. No caso de Saulo, que posteriormente tornou-se Paulo, apóstolo dos gentios, havia um caráter moral exemplar, para começo de conversa. Escrevendo anos depois sobre sua condição antes da conversão, o apóstolo declarou que, no tocante à justiça da lei, ele era “irrepreensível” (Fp 3.6). Ele era um “fariseu dos fariseus”: meticuloso em seus hábitos, correto em seu procedimento. Moralmente, seu caráter era imaculado. Após a conversão, sua vida foi de justiça no padrão evangélico. Constrangido pelo amor de Cristo, consumiu-se na pregação do Evangelho aos pecadores e no labor da edificação dos santos. Sem dúvida, nossos leitores concordarão conosco quando dizemos que provavelmente Paulo estivesse mais perto de atingir os ideais da vida cristã, e que ele seguiu após seu Mestre mais perto do que qualquer outro santo desde então.

Mas com o ladrão salvo foi, de longe, de outra forma. Ele não tinha vida moral alguma antes de sua conversão e nenhuma de serviço ativo depois. Antes dela ele não respeitava nem a lei de Deus nem a dos homens. Após sua conversão, ele morreu sem ter oportunidade de se ocupar no serviço de Cristo. Enfatizarei isso, porque essas são as duas coisas que são consideradas por tantos como fatores que contribuem para nossa salvação. Supõe-se que devemos primeiro nos adequar, desenvolvendo um caráter nobre diante de Deus, que nos receberá como seus filhos, e que depois dele haver nos recebido, para sermos experimentados, somos meramente postos à prova, e que, a menos que produzamos uma certa qualidade e quantidade de boas obras, “cairemos da graça e ficaremos perdidos”. Mas o ladrão agonizante não teve boa obra alguma, seja antes ou depois da conversão. Em consequência, somos levados à conclusão que, se ele foi salvo em absoluto, certamente o foi pela soberana graça.

A salvação do ladrão agonizante também arranja um outro apoio para que o legalismo da mente carnal se interponha para roubar de Deus a glória devida à sua graça. Em vez de atribuir a salvação dos pecadores perdidos à inigualável graça divina, muitos cristãos professos procuram explicá-las pelas influências humanas, instrumentalidades e circunstâncias. Seja o pregador, sejam circunstâncias providenciais ou propícias, sejam as orações dos crentes, tudo isso é visto como a causa principal. Que não sejamos mal entendidos aqui. É verdade que Deus com frequência se agrada de usar meios para a conversão dos pecadores; que amiúde condescende em abençoar nossas orações e esforços para levar pecadores a Cristo; que, muitas vezes, ele faz com que suas providências despertem e sacudam os ímpios para a percepção de seus estados. Mas Deus não está preso a essas coisas. Ele não está limitado às instrumentalidades humanas. Sua graça é toda poderosa e, quando lhe agrada, ela é capaz de salvar apesar da falta daquelas, e a despeito das circunstâncias desfavoráveis. Assim foi no caso do ladrão salvo.

Considere:

Sua conversão ocorreu numa época quando, exteriormente, parecia que Cristo havia perdido todo o poder para salvar, seja a si mesmo ou a outros. Esse ladrão havia marchado ao lado do Salvador através das ruas de Jerusalém e o tinha visto sucumbir sob o peso da cruz! É altamente provável que, como sua ocupação fosse a de ladrão e assaltante, esse fosse o primeiro dia que em que ele punha seus olhos no Senhor Jesus e, agora que o via, era sob toda a circunstância de fraqueza e desgraça. Seus inimigos estavam triunfando sobre ele. A maior parte de seus amigos o havia abandonado. A opinião pública estava unanimemente contra ele. Sua própria crucificação foi considerada como totalmente inconsistente com sua messianidade. Sua condição humilde foi uma pedra de tropeço aos judeus desde mesmo o início, e as circunstâncias de sua morte devem ter intensificado isso, especialmente a alguém que nunca o havia visto senão em tal condição. Mesmo aqueles que tinham crido nele foram levados à dúvida por causa de sua crucificação. Não havia ninguém na multidão que estivesse ali com o dedo apontando para ele e gritando: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” E, todavia, não obstante tais obstáculos e dificuldades no caminho de sua fé, o ladrão apreendeu a condição de Salvador e o Senhorio de Cristo. Como podemos explicar tal fé e tal compreensão espiritual em alguém em circunstâncias tais como a que se encontrava? Como podemos explicar o fato de que esse ladrão agonizante tomou um homem em sofrimento, sangrando e crucificado por seu Deus! Não pode ser explicado senão por intervenção divina e operação sobrenatural. Sua fé em Cristo foi um milagre da graça!

É para ser notado ainda que a conversão do ladrão ocorreu antes dos fenômenos sobrenaturais daquele dia. Ele exclamou: “Senhor, lembra-te de mim” antes das horas de trevas, antes do brado triunfante, “Está consumado”, antes do véu do templo se rasgar, antes do tremor de terra e do despedaçar das rochas, antes da confissão do centurião: “Na verdade, este era Filho de Deus”. Deus intencionalmente colocou sua conversão antes de tais coisas de modo que sua soberana graça pudesse ser engrandecida e seu soberano poder reconhecido. Ele calculadamente escolheu salvar esse ladrão sob as circunstâncias mais desfavoráveis para que nenhuma carne se glorie em sua presença. Ele deliberadamente dispôs essa combinação de condições e ambiente não propícios para nos ensinar que “a salvação é do Senhor”; para nos ensinar a não engrandecer a instrumentalidade humana acima da ação divina; para nos ensinar que toda conversão genuína é o produto direto da operação sobrenatural do Espírito Santo.

Deus nos abençoe!

Arthur W. Pink (1886-1952).

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Av. Silva Jardim, 4155 – Seminário.

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