“A ABSOLUTA SANTIDADE E A INFLEXÍVEL JUSTIÇA DE DEUS”
“E perto da hora nona exclamou Jesus
em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lama sabactani; isto é, Deus meu, Deus meu, por
que me desamparaste?” (Mt 27.46).
“DEUS MEU, DEUS MEU, POR QUE ME DESAMPARASTE?"
2. Aqui vemos
a absoluta santidade e a inflexível justiça de Deus.
A tragédia do
Calvário deve ser vista de pelo menos quatro pontos de vista. Na cruz o homem
fez uma obra: ele mostrou sua depravação ao pegar o Perfeito e com “mãos iníquas”
pregando-o no madeiro. Na cruz Satanás fez uma obra: ele manifestou sua insaciável
inimizade contra a semente da mulher ferindo o calcanhar dele. Na cruz o Senhor
Jesus fez uma obra: morreu o Justo pelos injustos para que pudesse nos
trazer a Deus. Na cruz Deus fez uma obra: ele exibiu sua santidade e
satisfez sua justiça derramando sua ira sobre aquele que foi feito pecado por
nós.
Que pena
humana é capaz ou apropriada para escrever acerca da imaculada santidade divina!
Tão santo é Deus que o mortal não pode vê-lo em seu ser essencial, e viver. Tão
santo é Deus que os próprios céus não são puros aos seus olhos. Tão santo é
Deus que até os serafins cobriam suas faces com véus diante dele. Tão santo é
Deus que, quando Abraão ficou de pé perante ele, clamou, “Sou pó e cinza” (Gn
18.27). Tão santo é Deus que, quando Jó entrou em sua presença, disse: “Por
isso me abomino” (Jó 42.6). Tão santo é Deus que, quando Isaías teve uma visão
de sua glória, exclamou: “Ai de mim, que vou perecendo porque... os meus olhos
viram o rei, o Senhor dos Exércitos” (Is 6.5). Tão santo é Deus que, quando
Daniel o contemplou numa manifestação teofânica, declarou: “Não ficou força em
mim; desfigurou-se a feição do meu rosto” (Dn 10.8). Tão santo é Deus que nos é
dito: “Tu és tão puro de olhos que não podes ver o mal, e que não podes
contemplar a perversidade” (Hc 1.13). E foi porque o Salvador estava levando
nossos pecados que o trinamente santo Deus não o contemplou, virou sua face
dele, abandonou-o. O Senhor fez que se encontrasse em Jesus as iniquidades de nós
todos: e nossos pecados estando sobre ele como nosso substituto, a ira divina
contra as nossas ofensas devesse passar sobre nossa oferta de pecado.
“Deus meu,
Deus meu, por que me desamparaste?” Essa era uma questão que nenhum daqueles ao
redor da cruz podia ter respondido; era uma questão que, ao mesmo tempo, nenhum
dos apóstolos podia ter respondido; sim, era uma questão que havia confundido os
anjos no céu, deixando-os sem resposta. Mas o Senhor Jesus havia respondido sua
própria questão, e sua resposta é achada no Salmo 22. Esse salmo fornecia a
mais maravilhosa predição profética de seus sofrimentos. Ele abre com as
próprias palavras da quarta elocução de nosso Salvador sobre a cruz, e é
seguido por mais soluços de agonia no mesmo tom até que, no versículo 3, achamo-lo
dizendo — “Tu és Santo”. Ele se queixa, não da injustiça, antes
reconhece a retidão de Deus — tu és santo e justo em cobrar de minhas mãos toda
a dívida para a qual me fiz fiador; tenho de responder pela totalidade dos
pecados de todo meu povo e, por conseguinte, ó Deus, és parte legítima em me
golpear com tua espada desperta. Tu és santo; tu és puro quando julgas.
Na cruz,
então, como em nenhum outro lugar, vemos a infinita malignidade do pecado e da
justiça divina na punição desse. Não foi o mundo antigo coberto pelas águas?
Não foram Sodoma e Gomorra destruídas por uma tempestade de fogo e enxofre? Não
foram as pragas enviadas sobre o Egito e Faraó e seus exércitos afogados no Mar
Vermelho? Nesses casos, o demérito do pecado e o ódio de Deus por ele puderam
ser vistos; mas muito mais o é aqui, em que Cristo é desamparado por ele. Vá ao
Gólgota e veja o Homem que é Companheiro de Deus bebendo do copo da indignação
do Pai, castigado pela espada da justiça divina, ferido pelo próprio Senhor,
sofrendo até a morte, pois Deus “não poupou seu próprio Filho” quando o
pendurou no lugar do pecador.
Eis como a
própria natureza antecipara a terrível tragédia — o próprio contorno do chão se
assemelha a um crânio. Eis a terra tremendo sob a poderosa carga da ira
despejada. Eis os céus e o sol fugirem de uma tal cena, e a terra ser coberta
de trevas. Aqui podemos ver a pavorosa cólera de um Deus que vinga o pecado.
Nem todos os relâmpagos do julgamento divino que foram liberados nos tempos do
Antigo Testamento, nem todas as taças da ira que serão despejadas sobre uma
Cristandade apóstata durante os tempos sem paralelos da Grande Tribulação, nem
todo choro e lamento e ranger de dentes dos condenados para sempre no Lago de
Fogo jamais deram ou mesmo darão uma tal demonstração da inflexível justiça de
Deus e de sua inefável santidade, de seu infinito ódio ao pecado, como o fez a
ira divina que ardeu contra seu próprio Filho na cruz. Porque estava sofrendo o
horripilante julgamento do pecado, foi desamparado por Deus. Aquele que era o
Santo, cuja própria repulsa ao pecado era infinita, que era a pureza
encarnada (1Jo 3.3), [Deus] “o fez pecado por nós” (2Co 5.21); portanto, ele se
curvou mesmo perante a tempestade de ira, na qual foi mostrado o desprazer
divino contra os incontáveis pecados de uma grande multidão que homem algum
pode numerar. Essa, então, é a verdadeira explicação do Calvário. O santo
caráter de Deus não podia fazer nada senão julgar o pecado, mesmo que
fosse achado no próprio Cristo. Na cruz, pois, a justiça divina foi satisfeita
e sua santidade reivindicada.
Deus nos abençoe!
Arthur W. Pink
(1886-1952).
*Faça-nos uma oferta (Pix 083.620.762-91).
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