“A BASE DA NOSSA SALVAÇÃO”
“E perto da hora nona exclamou Jesus
em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lama sabactani; isto é, Deus meu, Deus meu, por
que me desamparaste?” (Mt 27.46).
“DEUS MEU, DEUS
MEU, POR QUE ME DESAMPARASTE?”
3. Aqui
podemos ver a base da nossa salvação.
Deus é santo
e, por conseguinte, não aceita ver pecado. Ele é justo e, portanto, julga o pecado
em qualquer lugar onde seja encontrado. Mas Deus também é amor: Ele se deleita
na misericórdia e, em consequência, a infinita sabedoria ideou um meio pelo qual
a justiça pudesse ser satisfeita e a misericórdia liberada para fluir aos
culpados pecadores. Esse meio foi o da substituição, o justo padecendo pelo
injusto. O próprio Filho de Deus foi o selecionado para ser o substituto, pois
nenhum outro satisfaria. Através de Naum, a questão fora feita: “Quem pode
manter-se diante do seu furor? E quem pode subsistir diante do ardor
da sua ira?” (1.6). Essa questão recebeu sua resposta na adorável pessoa de
nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Só ele podia “manter-se”. Somente um
podia levar a maldição e ainda ressurgir como um vitorioso sobre ela. Somente
um podia suportar toda a ira vingativa e, todavia, glorificar a lei e torná-la
digna de honra. Somente um podia suportar que seu calcanhar fosse ferido por Satanás
e contudo naquela ferida destruir a ele, que tinha o poder da morte. Deus sustentou
um que era “poderoso” (Sl 89.19). Um que era ninguém menos que o Companheiro
de Deus, o resplendor da sua glória, a expressa imagem de sua pessoa Desse
modo, vemos que o amor ilimitado, a justiça inflexível e o poder onipotente combinaram-se
todos para tornar possível a salvação daqueles que creem.
Na cruz, todas
as nossas iniquidades foram postas sobre Cristo e, portanto, o julgamento divino
recaiu sobre ele. Não havia nenhum meio de transferência de pecado sem também
transferir sua pena. Tanto o pecado quanto sua punição foram transferidos para o
Senhor Jesus. Na cruz ele estava fazendo propiciação, e propiciação é apenas para
com Deus. Era uma questão de ir de encontro aos reclames divinos de
santidade; era uma questão de satisfazer as exigências de sua justiça. Não só
foi o sangue de Cristo vertido por nós, mas também vertido para Deus:
ele “se entregou a si mesmo por nós, em oferta e sacrifício a Deus,
em cheiro suave” (Ef 5.2). Dessa forma, isso foi prefigurado na memorável noite
da Páscoa no Egito: o sangue do cordeiro deve estar onde o olho de Deus o possa
ver — “Vendo eu sangue, passarei por cima de vós”.
A morte de
Cristo na cruz foi uma morte maldita: “Cristo nos resgatou da maldição da lei,
fazendo-se maldição por nós; porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado
no madeiro” (Gl 3.13). A “maldição” é alienação de Deus. Isso fica evidente pelas
palavras que Cristo ainda dirá àqueles que estarão à sua esquerda no dia de seu
poder — “Apartai-vos de mim, malditos”, ele dirá (Mt 25.41). A maldição
é desterro da presença e glória divinas.
Isso explica o
sentido de vários tipos do Antigo Testamento. O boi que era morto anualmente no
Dia da Expiação, após seu sangue ter sido espargido sobre e diante do propiciatório,
era removido para um lugar “fora (exterior) do arraial” (Lv 16.27) e ali
seu cadáver era queimado por inteiro. Era no centro do acampamento que Deus
tinha sua residência, e a exclusão do acampamento significava banimento de sua
presença. Assim também com o leproso. “Todos os dias em que a praga estiver
nele, será imundo; imundo está, habitará só; a sua habitação será fora do
arraial” (Lv 13.46) — isso porque aquele era o tipo encarnado do pecador. Aqui,
ainda, está o antítipo da “serpente de bronze”. Por que Deus instruiu Moisés a
colocar uma “serpente” sobre uma haste, e ordenou aos israelitas mordidos para
olhar para ela? Imagine uma serpente como tipo de Cristo, o Santo de
Deus! Sim, mas ela representava-o como “[feito] maldição por nós”, pois a
serpente era a lembrança da maldição. Na cruz, então, Cristo estava cumprindo
esses símbolos do Antigo Testamento. Ele estava “fora do arraial” (compare Hebreus
13.12) — separado da presença de Deus. Ele era o “leproso” — feito pecado por
nós. Ele era como a “serpente de bronze” — feito maldição por nós. Daí, também,
o profundo significado da coroa de espinhos — o símbolo da maldição! Levantado,
coroado de espinhos, para mostrar que estava levando a maldição em nosso lugar.
Aqui, também,
está a significação das três horas de trevas que cobriram a terra como uma
mortalha de morte. Era uma escuridão sobrenatural. Não era noite, pois o sol
estava em seu zênite. Como bem o disse o Sr. Spurgeon, “Fez-se meia-noite ao
meio-dia”. Não foi eclipse algum. Os astrônomos competentes nos dizem que ao
tempo da crucificação a lua estava à sua maior distância do sol. Mas esse brado
de Cristo dá o sentido das trevas, enquanto que essas nos dão o significado
daquele amargo brado. Somente uma coisa pode explicar tal escuridão, visto que
uma coisa apenas pode interpretar tal clamor — que Cristo havia tomado o lugar
dos culpados e perdidos, que ele se pôs no lugar para levar os pecados, que ele
estava sofrendo o julgamento devido por seu povo, que ele que não conheceu
pecado “[Deus] o fez pecado” por nós. Aquele brado foi proferido para que a nós
fosse concedido saber do que se passava ali. Era a manifestação da expiação,
por assim dizer, pois três (três horas) é sempre o número de manifestação. Deus
é luz e as “trevas” é o sinal natural de sua repulsa. O Redentor foi deixado sozinho
com o pecado do pecador: tal era a explicação das três horas de escuridão.
Assim como repousará sobre o condenado eternamente uma dupla miséria no lago de
fogo, a saber, a dor do sentido e a dor da perda; do mesmo modo, Cristo, em
correspondência, sofreu a ira de Deus derramada sobre si e também o afastamento
de sua presença e comunhão.
Para o crente
a cruz é interpretada em Gálatas 2.20: “Estou crucificado com Cristo”. Ele foi
o meu substituto; Deus considera-me um com o Salvador. Sua morte foi a minha. Ele
foi ferido por minhas transgressões e ferido por minhas iniquidades.
O pecado não foi afastado, mas descartado. Como disse alguém: “Porque Deus
julgou o pecado sobre o Filho, ele agora aceita o pecador crente no Filho”.
Nossa vida está escondida com Cristo em Deus (Cl 3.3). Eu estou encerrado em
Cristo porque Cristo foi excluído de Deus.
Ele sofreu em
nosso lugar, ele salvou seu povo assim; A maldição que caiu sobre sua cabeça,
era por direito devida por nós. A tempestade que curvou sua bendita cabeça, é
apaziguada para sempre agora E o descanso divino é meu no lugar, enquanto ele
está coroado de glória.
Aqui então
está a base da nossa salvação. Nossos pecados foram levados. As reivindicações
divinas contra nós foram plenamente satisfeitas. Cristo foi desamparado por
Deus por um tempo para que pudéssemos desfrutar da sua presença para sempre. “Deus
meu, Deus meu, por que me desamparaste?” Que toda alma crente dê a resposta: ele
adentrou as terríveis trevas para que eu pudesse andar na luz; ele bebeu o
cálice de angústia para que eu pudesse beber o cálice de gozo; ele foi
abandonado para que eu pudesse ser perdoado!
Deus nos
abençoe!
Arthur W. Pink
(1886-1952).
*Faça-nos uma oferta (Pix 083.620.762-91).
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